sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Rafaela

A névoa artificial, a música pop-eletrônica, os olhares ansiosos por seu corpo, ansiosos por um erro seu... conhecia bem tudo aquilo, conhecia a correria da troca de roupas, conhecia os esporros dos estilistas... Já não era sua primeira passarela... Lembrava-se de sua infância; como sua mãe, que nunca pôde ser modelo porque engravidara, contava do glamour e da beleza da profissão. As duas montavam passarelas de lençóis por onde a pequena Rafaela desfilava com suas roupas e arranjos improvisados. Tudo era uma festa, onde uma cobrinha de pelúcia virava uma echarpe de luxo. Mamãe aplaudia de pé a desenvoltura da filha, não se privando de consertar quaisquer erros que cometesse ou de ensinar os modos adequados de se andar. Rafaela sorriria se pudesse, se não estivesse sendo vigiada por algumas centenas de olhos prontos para ver o menor deslize, o menor traço que fugisse da natureza morta de um manequim. Rafaela entendia sua função, era ser objeto de desejo, mas não menos objeto. Era seduzir com a apatia da mosca morta que representava. Mas não foi sempre assim... Enquanto as luzes da fama pareciam longe, um sonho a conquistar, Rafaela via na profissão de modelo tudo aquilo que desejava para sua vida. Via na passarela seu habitat, o lugar onde se sentiria mais a vontade e poderia melhor se expressar. Foi aos treze anos que assinou seu primeiro contrato. Também foi aos treze que conheceu Geraldo Bergmann, seu agente. Ainda naquele ano fez seus primeiros desfiles e sua mãe, sempre orgulhosa, sentava-se sempre na primeira fileira. Como hoje... os passos, os ossos quase expostos a ranger, os dentes a cerrar, os batimentos, tudo ecoava em sua mente mais alto que a música do desfile. Lembra-se de como era fácil ser modelo aos treze anos, ainda possuía a promessa do glamour... aquele glamour ofuscante que tanto desejara e por tanto tempo... agora que o tinha... percebia que não era tão maravilhoso assim... Entre privações, reclusões e assédios, Rafaela desejava o que não podia: mudar de vida. Fora criada nessa vida e agora não haveria escape. Lembrava-se de quando começou a ver-se presa... foi aos quinze anos... também foi quando perdeu a virgindade. Foi Geraldo Bergmann, seu agente, quem a tirou. Rafaela não queria, muito menos com ele, aquele homem feio, em seus cinquenta e tantos anos, que fedia a colonia e cigarro. Não...Não queria... mas não teve escolha. Bergmann a ameaçou tirar-lhe sua carreira, seu sonho, tudo o que tinha... Perdeu, assim, a inocência, e foi carregada para dentro do fazer o que for preciso pela carreira. Emagreceu, parou de comer decentemente, vomitou algumas vezes por semana, entrou no mundo das drogas pesadas para suportar - e porque não havia outra opção. Nunca teve chance de amar, de viver... Percebia agora, na maturidade dos seus trinta anos, o quanto deixara para trás pelo glamour... O glamour que só desejava longe agora... Olhou pelo canto do olho para sua mãe, orgulhosa como sempre ao ver a filha desfilando. Os olhos encheram-se de lágrimas, um misto de dor, raiva e pena. Segurou. Não poderia chorar ali, agora não. Deveria fazer como fazia normalmente, deveria esperar acabar o desfile, deveria chorar sozinha no hotel, com a carreira de cocaína pronta para ser cheirada. Deveria, mas não conseguiu. Desabou na passarela e caiu em prantos. As lágrimas tinham um sabor acridoce... Estava tudo acabado agora.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Lá fora vejo toda sorte de escritores medíocres, uns fazendo sucesso, outros desconhecidos, mas todos reunidos, ainda que inconscientemente, em sua imensa trupe tragicômica a girar pelo mundo assombrando aqueles que procuram algo nas palavras além da rasa comunicação verbal que supõe-se delas... Vejo tantos quanto me dá medo de existir desses por aqui dentro, gados marcados a contragosto com a triste insígnia da mediocridade... Quão triste não é isso? Ser posto a força num grupo que despreza?

Quero fumar um emaranhado de qualquer coisa que dê para emaranhar, respirar aquele ar denso, escuro que me faz ver melhor. Ar seco, áspero... Bebo por osmose o sangue daqueles que me cercam, que morrem porque não há nada mais a fazer, morrem por inércia, que seja forçada, mas inércia...

Quero doer toda dor que não me pertence, numa pretensão imensa de tomar os fardos alheios, de me sentir melhor comigo mesmo, com minha consciência... Aquele ar que me dói os pulmões, o quanto esperei por esta dor...

Quero sentir tudo, apreender o Universo! Quero amar a todos, quero ser! Quero a dor dos outros para substituir a minha, a minha... a minha...

Quero preencher a solidão com falsas esperanças...
Pensar "porque diabos alguém me leria?" é o suficiente para me fazer parar de escrever... Ao que parece não é preciso muito para me desestimular... Enfim... Medíocridade... Taí uma coisa que me persegue. Isso e a impotência, a boa e velha. Escrita medíocre e broxa, é a minha... Não me estenderei. É isso.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

O que fazer quando suas crenças são destruídas? Para onde ir? A quê recorrer? Quando se molda um modo de agir, de enxergar, de viver, enfim, em cima de uma estrutura que se arruína, que fazer? Viver em ruínas, mesmo assim, que se danem as evidências? Não, isso não dá... Me pergunto, no entanto, se eu fui ingênuo demais, se eu não me seguei a realidade, se minha estrutura já estava em ruínas bem antes de eu perceber... Cavando com pá em pedra dura, cortando árvore com canivete, o trabalho é intenso, é verdade, mas não se chega a lugar nenhum.

Pelo visto a solução é a violência.

Ah, a violência, é verdade.

Ela, de quem eu fugi e só agora entendo a importância que tem... Ela, que conduz o mundo, não é verdade? Pois bem, a violência... Sou covarde...Por mais que entenda agora sua fundamentação, sua necessidade, me recuso a segui-la, a usá-la...

Me retiro em derrota, se é pela violência a vitória, afundo-me em minhas ruínas e não quero mais saber. Prefiro a solitária derrota, mas que seja pacífica, do que a derrota a custa do ferimento alheio. Que eu, que me proponho a lutar, me fira, sim, mas não aqueles a quem eu me oponho, eles nada tem a ver com minha revolta, eles nada tem a ver com minha indignação, eu não luto contra eles, eu luto por mim e luto pelo povo... Ou pelo menos era o que eu acreditava... O povo... Que é esse ser abstrato, aparentemente homogêneo e indefeso, mas que é, mais que nada, indefinível e indomável?
É mesmo?
Lá vou eu com minha romantização do povo... Se já disse que é indefinível, porque insisto em defini-lo? Talvez esteja errado novamente, talvez o povo seja aquela massa que tanto nos falam.

Massa indistinguível entre si, mas bem separada do resto, que são eles que a classificam. Ninguém nunca se diz parte da massa...

Nem povo, nem ninguém, nem nada... Não represento a outro que não seja a mim, vejo isso agora com total clareza. Não luto por outro que não seja por mim... E se não vale a pena, se não vale a pena lutar por mim... Não luto. Não luto por nada. Deixo-os com a violência, deixo-me em paz.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

JAZZ AQUI O CONCEITO





Fernandes

Fernandes riu suave... um sorriso melancólico completava aquela risada nostálgica. Enquanto segurava o livro, enquanto lia a dedicatória, enquanto o turbilhão de memórias lhe agitava a velha mente cansada... Éramos tão jovens... Achávamos que duraria para sempre... "a melhor coisa que já me aconteceu" não era mentira, naquela época não era... Como amava ela... e como ela o amava... E como tinham em comum... e o quanto viveram... e o quanto poderiam ter vivido... Vez em quando se perguntava se as coisas poderiam ter sido diferentes, e como seriam se tivessem sido... Teriam se casado? Nos amávamos tanto... O que aconteceu? Tido filhos? Adorávamos discutir o futuro... Criado uma vida juntos...? Nunca pensamos que fosse acabar, nunca, nunca... Mas acabou. Acabou... Não se sabe bem como ou porquê... simplesmente acabou. Bom... Fernandes deixou de lado o livro com a dedicatória... olhou para a esposa, sentada no sofá, vendo a novela. Amava-a, apesar de tudo... Olhou novamente o livro e riu, suave.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

divagações...

A gota que me cai na face arde... arde como o ar que me entra nos pulmões... Talvez seja o gelado da solidão desses meses... Não me suporto mais...

Se em cada segundo me passam vidas... em cada minuto, gerações... Se Deus me fez vivo pro infinito... só lhe peço, inferno cativo, que não me cumpras em eternidade...

A prisão nunca é perpétua, há sempre a morte-redenção. Pois se além da vida há a eternidade, que faço? Morro mil vezes até que se acabe... a transcendência do infinito é o fim.

E é nele que descanso.

Pois se sou só, não sou diferente de ninguém. A solidão não é em não estar com outros, mas em necessitar deles. Tão coletivamente isolados... Tão divinamente desgraçados...

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Uma coisa interessante da dor;

Algo tão pessoal... tão absolutamente individual... mas que une toda a humanidade ao redor de uma mesma fogueira que possa acolhê-los...
Como a dor e o sofrimento, tão diferentes quanto há pessoas, podem ser tão absolutamente compreensíveis a todos?

Será a empatia?

Companheiros de Abismo e divagações

I


E do homem que morre e deixa a si... da mulher que faz sexo porque precisa (porque precisa...!)... do homem que chora o próprio lamento... da mulher que seduz a própria desgraça... do homem que corrói o próprio couro, com pregos de metal... da mulher que se esconde atrás de si mesma, alma tímida em escudo de carne... do homem que morre... da mulher que deixa de viver... de duas almas desgraçadas... de dois destinos destroçados... do céu estrelado... da lua amarela... da luz que os ilumina... da inevitabilidade de um abismo... um mesmo abismo... do assobio do vento... dos cabelos esvoaçantes... da ardência dos olhos... do duro... do sangue... do olhar... o mesmo olhar... do amparo cego... do mesmo olhar... do arrefecimento...


II


Se é no abismo que nos encontramos com nossa solidariedade, se é no abismo onde conseguimos, após tanto tempo na escuridão, apreciar com tanto furor o feixe de luz, o verde, vermelho, azul, após anos de cinza... Se é no abismo que, sozinhos, aprendemos a ser humanos...

É realmente?

Ser humano é ser sujeito antes de ser pessoa? É ser eu antes de ser nós? É sofrer antes de gozar? É não ter antes de ganhar?

É morrer antes de viver?


Ser... ou não ser... se esta dúvida é, para mim que nunca terminou Hamlet, quanto à própria finitude da vida, seria ela uma constatação ou um dilema? Sou ou não sou? ou Serei ou não serei? É uma dúvida perante a vida em si ou perante a morte? É a hesitação da própria existência ou a vontade do suicídio? Preciso ler Shakespeare...


III


Me pertence minha vida, afinal? Quem ou quê deu-me-a? Certamente não veio por espontânea vontade... devo crer que minha complexa existência se resume a um conjunto de reações químicas? De sistemas de causa e efeito biológicos? E qual seria o problema? Não creio que isto tiraria a beleza da vida em si... Tiraria? Se a vida é minha, o que é o Universo? O livre-arbítrio não existe, estamos sob suas leis... Não serei nunca mais poderoso que a gravidade, mais poderoso que o átomo ou que eu mesmo... Vivemos sob constante contradição. Se não somos parte do Universo, somos parte do quê? Se não somos Natureza, quê somos?! Haveria uma esfera de poder e possibilidades afora da Natureza que nos comportaria? Não, claro que não, ainda estamos sujeitos a todas as regras que definem o que achamos que nos é externo. Somos, então, externos a nós mesmos? Ou seríamos nós internos ao que nos é externo, ou seja, parte de um todo que não consideramos por sermos arrogantes e prepotentes demais? Aposto todas as minhas fichas nesta última. All-in! Mas ainda não compreendo. O que nos diferencia - certamente existe algo - do "resto"? Cultura, isto é! Não temos onças pintadas se comportando de maneiras diferentes, temos? Onças pintadas serão onças pintadas em qualquer lugar do mundo. Seres humanos, no entanto, diferem tanto quanto há possibilidades. Diversidade cultural. Se, naturalmente, somos homogêneos, entre nós somos completamente distintos... Estas distinções serão obra de um conjunto de relações químicas? Duvido... Teríamos que admitir que tal etnia seria quimicamente diferente de outra para tal... Sabemos que não é verdade. Seriam as condições geográficas? Talvez, mas não é difícil haver duas etnias completamente diferentes no mesmo lugar geográfico, enquanto uma outra mais longe pode ser mais parecida com uma das duas antes mencionadas. O que então? O que controla o mecanismo de reconhecimento de padrões que temos em nosso cérebro? O que cria deuses, mitos, ritos, ferramentas, comidas, elaborações? Será realmente apenas o cérebro? Mas o que o garante a individualidade? O que confere a cada ser uma personalidade? Serão apenas os genes? São perguntas que, até agora, as respostas dadas não me satisfizeram... Bom... Se alguém souber, pode me dizer...











sábado, 13 de outubro de 2012

Do voto facultativo num processo democrático

Cansado de ouvir - principalmente nessa época - de voto facultativo, deixo aqui meu protesto - que pode muito bem ser contestado, não se acanhe, invisível leitor.


Vivo repetindo que o voto facultativo é uma ferramenta elitista e oligárquica para a manutenção do status quo. Sim, sempre as mesmas palavras. Pois bem, aos que não me compreendem ou aos que não concordam ou aos que não tem nada a fazer - convenhamos, porque outro motivo alguém estaria lendo isso? - deixo aqui explicado meu ponto de vista.

Primeiro ponto: Democracia. Que ser democracia? O primeiro vai gritar "LIBERDADE!". O segundo "UMA MÁQUINA BURGUESA DE MANUTENÇÃO DO PODER". O terceiro "iu esse ei! iu esse ei!". Bom... darei primeiramente meu parecer, se não concorda, foda-se ponha sua opinião nos comentários. Democracia é, antes de mais nada, uma palavra. Palavras tem origem, o que os linguistas chamam de etimologia. Sendo assim, a origem, a etimologia da palavra democracia vem do grego "demos" que quer dizer "povo", ou algo parecido, e "kratos", que é poder. Aula de história do ensino médio a parte, vamos ao que interessa. Poder do povo. Esse conceito, oboviamente, surgiu na Grécia, mais precisamente na cidade-estado de Atenas, bem antes de Rousseau ou outros "iluminados". Claro que a democracia clássica grega era bem diferente do que temos agora, mas a essência - o poder do povo - continua. No entanto, o quanto esse povo realmente tem poder? Acho que é em cima deste questionamento que vieram as críticas à democracia por parte de (até hoje) conhecidos filósofos (Platão, Aristóteles e quem mais). Se a democracia é comandada pelo povo, enxergava-se o controle desse povo. A cidade, então, estaria "sujeita à ação de demagogos e oportunistas". Lindo. Apesar dessa crítica ainda ser válida, em certos aspectos, hoje em dia criticar a democracia é mais que tabu, é pecado capital com pena de linchamento até a morte. Mas então eu faço o seguinte questionamento.

Se o povo tem poder e este mesmo povo é controlado, então o poder é apenas virtual. Consequentemente, quem tem poder não é o povo, mas estes que o controlam. Podemos chamar este modelo, então, de "democracia", mantendo-se fiel às raízes etimológicas da palavra? Creio que não, para mim, isto se traduziria muito bem como uma oligarquia, onde poucos retém o poder e o povo é apenas massa de manobra política, para lá ou para cá. Massa de manobra. Massa. Me desagrada imensamente usar esta palavra, já que eu mesmo não sei se acredito na procedência deste conceito. Mas enfim... deixemos isto de lado por hora e vamos prosseguir.

O que é, então, democracia? Ao meu ver, existem alguns pontos fundamentais na formação do conceito de democracia.

1. Para começar, democracia, como já vimos, é o poder do povo. Não vou entrar em maiores redundâncias.

2. Em segundo lugar, é um Estado de direito, certo, mas também um Estado de deveres. Se o povo tem o poder, ele tem o direito e o dever de exercê-lo. Neste contexto, o voto obrigatório é não uma opção, mas uma obrigação - evidentemente - para o cumprimento do processo democrático.

3. Se o povo tem o poder, sua ausência destrói o processo democrático. Tem que haver PARTICIPAÇÃO POLÍTICA POPULAR, coisa que nos falta nos dias de hoje. Este terceiro ponto é importantíssimo, é ele que vai definir o que é, para mim, de fato um Estado democrático.


Então, se parto desses três princípios, vejo que, realmente, não vivemos em uma democracia. Não sei sequer se é a vontade do povo viver em uma democracia. Ao contrário, somos praticamente uma monarquia constitucional com alta rotatividade. O povo não tem o poder, se há legitimidade nas eleições, não há representatividade que substitua o povo em si, sua participação efetiva política. Enfim, boto meus sonhos esquizofrênicos de lado e vamos à realidade das coisas como elas são. O povo não vai participar da política nem tão cedo. Não vou me aprofundar nisso, o leitor sabe muito bem que a maior parte da população já faz milagre ao conseguir respirar entre trabalho, trânsito e família. Não vai participar, assim, como deveria, principalmente por falta de tempo. Tenho minhas dúvidas quanto ao mito da falta de interesse do povo por política.

Mas então, sendo realista, vimos nesta, como em muitas outras eleições, a compra de votos. Nesta eles inovaram, colocando uma microcâmera em um chaveiro para provar que votou no candidato X. Gostaria de saber, primeiramente, o que faz os defensores do voto facultativo pensarem que a compra de votos pararia. É muito fácil, com a máquina que existe hoje, deixar o povo de fora da política, comprar os votos necessários para se ganhar uma eleição. Mas tudo bem, vamos supôr que isto não ocorra, vamos supor que, conforme o delírio popular (não se ofenda, inexistente leitor, tenho meus delírios também), apenas os interessados em política - os que realmente se preocupam - votariam. Vamos supôr ainda, avançando mais na esquizofrenia aguda, que todos eles pensem no bem comum. Pergunto: isto não caracteriza uma oligarquia? Se apenas a Zona Sul do Rio votasse, Freixo iria para o segundo turno? Muito provavelmente. No entanto, esta seria uma decisão válida? Seria uma decisão legítima dentro de uma democracia? Ah... por mais que tentemos, por mais que insistamos, sempre aparecerá aquele caráter elitista em nossas palavras. Vale o elitismo por um "bem comum"? Em todo caso, sabemos que, esquizofrenias a parte, as pessoas não votam no bem comum e, caso realmente não houvesse votos comprados, caso realmente o mito do desinteresse por política  por parte da massa - maldita palavra - seja real, a eleição apenas adensaria o abismo da desigualdade e, caso não, não haveria legitimidade alguma, seríamos apenas eles e nós, a massa - agora sim manipulada - e a elite - esta que comanda as direções da nação -, mesmo que seja uma "elite intelectual" e não propriamente econômica - mas afinal, não estão ligados os dois? Em qualquer um dos casos, apenas se acentuaria a ideia de cidade partida, de país partido, entre os que votam e os que não votam. Ademais, acentuo, é muito fácil manter a falta de interesse - alienação, que seja - pela política, e é justamente esta falta de interesse que destrói o processo democrático tal como minha esquizofrenia deseja que ele seja. E é justamente esta falta de interesse que é criticada e ao mesmo tempo subliminarmente elogiada pelos partidários do voto facultativo. Pois, se não houve segundo turno, é óbvio que quem votou para isso ou teve os votos comprados ou não teve interesse político.


Sobre o voto obrigatório, eu repito o que eu já disse: participação política é uma obrigação, não apenas um direito, em um regime democrático. Se não há, porque não há como, participação efetiva, que seja então, pelo menos, pelo voto.

Talvez minha mais aguda crise esquizofrênica seja em relação ao povo. Creio piamente no povo, o povo em geral, a consciência coletiva, popular, enfim... Tenho uma certa ideia que sei, é muito provavelmente errada, mas que insiste em grudar em mim: o povo, independente de qualquer coisa, não é idiota. Sabe, portanto, quando está na merda - pois vive, não é alienado à realidade, como muitos tentam colocar. Sabe quando está melhor. Claro que fiquei irritadíssimo com o resultado das eleições no Rio, mas logo fiquei mais satisfeito. Pois sei que se para mim Marcelo Freixo deveria não só ter ido pro segundo turno, mas ganhado a eleição, sei também que não sou o único ponto de vista válido. Há aqueles que votaram no Paes por medo, por propaganda ou por venderem seus votos, mas tenho certeza que muita gente - infelizmente para mim e meus companheiros de ideologia - votou porque sentiu a melhora - que, convenhamos, de fato ocorreu, até porque né... E eu não poderia nunca ir contra a vontade da maioria.

Quando fala Maquiavel sobre a instalação de novas instituições, ele diz que é o mais difícil trabalho do Príncipe, isto porquê "aquele que se dedica a tal empreendimento tem por inimigos todos quanto se beneficiavam das instituições antigas, e só acha tíbios defensores naqueles para quem seriam úteis as novas", e complementa Jean-Jacques Chevallier: "Tíbios, porque têm medo dos primeiros: tíbios porque são, como todos os homens, incrédulos e porque não puderam convencer-se, pela experiência, da excelência das coisas novas". Sendo assim, me contento, pois, resumindo, temos medo da mudança e do que é novo. E, se Freixo, sugirndo como algo absolutamente novo, conseguiu cerca de 30% dos votos, é porque sim, estamos progredindo, pelo menos na minha visão de progresso. Estamos, lentamente, abraçando aquilo que representa mudança. Este evento é progressivo e constante, a mudança de mentalidade nunca pára, está sempre assimilando tudo ao seu redor, não somos quadros eleitorais, somos seres dinâmicos e assim é nossa sociedade. Sobretudo, é um evento coletivo, algo que muito provavelmente não ocorreria da mesma forma caso o voto fosse facultativo.

Exemplificando: Nas eleições passadas para o Congresso americano, menos da metade da população conseguiu botar uma maioria republicana na Casa Branca. Como podemos chamar isso de soberania do povo?

Bom, é isso... eu não estou com saco de reler tudo, se eu tiver esquecido de algo, cometido alguma redundância ou enfim... depois eu conserto. Deixe sua opinião se quiser, se é que alguém realmente vai ler esta bosta.












Journey

Para começar, Journey é um jogo - maravilhoso, por sinal - de playstation 3. Minúsculo, deve levar uma hora e meia pra terminar se você for lerdo como eu sou. Enfim... Conta a história muda de um viajante - você - que vai em direção a uma montanha. Em seu caminho você por vezes encontrará outros viajantes. A princípio eu pensei que fazia parte da história, tratei de pegar os itens antes que o outro pudesse. De certa forma faz... É, no entanto, outra pessoa que está jogando. A ideia é justamente a de companheiros para a jornada. Não se trava uma jornada sozinho e o jogo insiste nisso desde seu conceito. Journey é lindo, tanto visualmente quanto de conteúdo. A ideia, segundo os desenvolvedores, é criar um laço entre as pessoas, fazer com que elas se importem umas com as outras através do jogo, mostrar "o lado positivo da humanidade". De certa forma dá certo. Quando percebi que se tratava de uma pessoa e não de um programa, minha atitude mudou completamente, ajudar e tentar se comunicar da melhor forma com o companheiro de viagem é praticamente obrigatório no jogo. Não há comunicação efetiva, e essa era a ideia. Não há nomes - até acabar o jogo - e isso também faz parte do jogo. Os desenvolvedores dizem que retiraram, deixaram só o cru - do jogo e dos jogadores - para que os preconceitos não ficassem entre os jogadores. Bom... claro que não vou dizer nunca que um jogo consegue sequer chegar perto do contato real tete-a-tete. Mas devo admitir que, em um mundo onde as relações estão cada vez mais afastadas e as pessoas cada vez mais individualistas e isoladas, Journey é um jogo interessante, com uma proposta interessante e que vale muito a pena ser abraçada - tanto dentro quanto fora do video game. Se tem uma coisa que é absolutamente verdade nesse mundo - e o jogo mostra bem isso - é que nossa jornada, seja qual for, nunca será solitária.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Criaturas de expressões grotescas, de pernas viradas ao avesso e ossos saltando às juntas aglutinam-se ao redor da fogueira onde as mulheres são queimadas - as mulheres são queimadas - as mulheres são queimadas - as mulheres são mulheres - as queimadas as mulheres são mulheres são queimadas - dantesco! algum berro horrorizado ao longe, apenas para ser ignorado - a dor da indiferença - chora! nem medo tens o direito de sentir! as mulheres na fogueira lamentam serem mulheres na fogueira. as mulheres na fogueira se debatem, tentando livrar-se das garras muito bem apertadas do fogo, das garras muito bem ajuntadas de sua própria carne carbonizada. as mulheres foram queimadas e as bestas estão a sorrir, suas patas quebradas e deslocadas garantem a inconstância do movimento, o tombo e a dor e elas riem. as bestas caem e riem, algumas caem na fogueira, com as mulheres que lamentavam ser mulheres, e riem enquanto queimam e se misturam às cinzas das mulheres. chora! diante desta cena, nem as bestas nem as mulheres queimadas nem mesmo deus, que observa tudo em seus últimos e desesperados arranques de fôlego moribundos, prestaram atenção em você. a dor da indiferença. pula na fogueira! nem o fogo te queima! sofra! viva morto como um fantasma!

sábado, 22 de setembro de 2012

Foi só quando ela o abraçou por trás - quando ela o empurrara para fora de sua própria mente - que ele entendeu que não poderia mais ficar ali. Desculpe, disse ele, não é nada pessoal... parou um momento e completou é sim... é muito pessoal, pessoal demais. E era, não conseguiria, pessoalmente falando, mais suportar estar ali, viver ali, se sentia como um intruso, como um parasita de estimação, queria andar sob suas próprias pernas, sentir suas próprias dores, comemorar suas próprias conquistas. Talvez seja egoísmo meu, disse ele, mas não consigo mais te olhar de baixo, não saber se eu consigo andar sem sua ajuda. Era egoísmo. Ela chorou, a dor da perda e da culpa arrebatando-a para o quarto, a porta trancada e o grito abafado de então vai, vai agora porra, o desespero de não o ter mais por perto evidente em sua voz. Ele observou a cena em silêncio, ouvia ela chorar por trás da porta enquanto apanhava a mala e ia embora.

sábado, 15 de setembro de 2012

Do Abismo

Auto piedade! É esse o nome do pesado fardo que carrego! Reconhecer a própria insignificância perante o Universo é engrandecedor; o caos e a grandeza do infinito me trazem confiança quanto a minha existência pueril (poeiril?). Mas reconhecer a própria insignificância perante os outros é... triste... desconcertante... Ser realista, no meu caso, é ser inseguro e ciente das não tão longe limitações. Ah, que paredes grossas tem esse minúsculo cômodo... e quão opressoras são... quão claustrofóbico é permanecer aqui, mas mesmo assim fico... não há como fugir. Sei que sou fraco, sei disso... haha, dou risadas na cara da fraqueza, não é ela que me perturba. Sei que perderei, deixarei cair aquilo que seguro querido em meus braços frágeis e sei que não tardará, mas isso também não é o problema. Não tanto perder, mas esperar perder a qualquer tempo. A iminência da queda que me consome, este é o problema. O problema é esperar tropeçar a cada passo, sentir o abismo a cada relance... O pior desespero é o de acordar de madrugada pela perna contraída e suplicar aos berros que não, por favor, não! e se agarrar ao travesseiro no aguardo da excruciante dor de dilaceração muscular e, por fim, se entregar aos braços da cãibra. A espera da dor... dói. Sei que sou fraco pois esta dói mais. Sei que sou fraco pois berro. Sei que sou fraco pois sei que chorarei quando a dor enfim chegar. Penso, às vezes, que talvez seja melhor eu mesmo infligi-la, não sei, pode ser que doa menos uma dor causada por mim. Mas sou fraco. Não tenho coragem... A pequenez perante os outros me frustra, tamanho é meu ego ferido. O Universo não, ele tem pedestal de grandeza aos meus olhos, mas as pessoas... detesto admitir todos os dias o quão maiores são, o quão miserável - em tantas conotações da palavra - eu sou. Estou com frio agora... literalmente, não é figura de linguagem. Com frio e com calor e enjoado e triste. E cansado... a dor no meu corpo que me cansa é a mesma que me impede de dormir e descansar. Me sinto lixo contraído... Enfim... não sei se alguém sabe como é isso... dificilmente... mas talvez eu tenha algum companheiro de abismo. É claro que ele estará muito ocupado com suas próprias divagações sobre a dor da queda, cada um sabe de seus ossos quebrados.
Moça da marca do coração partido:
Que incoerente és...
Pois só fazes curar meu peito ferido.

Te amo
Ponto
Não há nada mais há declarar

Te amo
Pronto
Que sua marca maranhense venha me abraçar.

Velório

Eu gostaria de agradecer à minha mãe, meu pai... por estarem comigo a vida toda, me apoiarem, me incentivarem... também aos meus amigos, desde a escola, sim estou falando de vocês, Pedro, Juliana, Joãozinho, Jairo... e toda a galera que eu não mencionei. Ãhm... quem mais? Meu avô, logo estarei com ele, minha avó Tita, claro... É... acho que é tudo. Gostaria de deixar meu desprezo também... pra começar, à Marjorie, minha namorada, Thiago Mendonça de Carvalho, o amante dela, seja lá quem for, Gustavo, que roubou minha promoção... acho que só... Tive uma vida razoável, até... deu pra ser considerada boa, eu acho... bom... que mais? Um lamento por nunca ter conseguido conhecer Fernandinha depois de crescida, aquela que, para os que não sabem, foi minha paixão de infância... E... é isso, eu acho... já posso morrer. Beijos para todos, os salgados estão lá no fundo, junto das bebidas, estas estão em isopores, já tá tudo arranjado. Até nunca mais.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012


IX - O abismo

Pascal tinha um abismo, com ele em movimento.
- Pena! tudo é abismo - ação, desejo, sonho,
Palavra! E no meu pelo que de pé eu ponho
Muitas vezes do Medo ouço passar o vento.

Ao alto, abaixo, além, a profundeza, o mar,
O silêncio, o espaço, horrível, cativante...
Em minhas noites Deus, com mão conciliante,
Desenha um pesadelo vário e singular.

Temo o sono assim como se teme a voragem,
Cheia de vago horror, e com perdida margem;
Pelas janelas só o infinito vou ver,

Meu espírito sempre habitado de espasmo,
Do nada inveja mesmo é o insensível marasmo;
- Ah! Não sair jamais do Número e do Ser!

Baudelaire, em As Flores do Mal (tradução de Mário Laranjeira)

sábado, 1 de setembro de 2012


Julho
10
11
13
19
20
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27
29

Não, leitor, não é pra vc entender
Eis que eu estava certo. Meu futuro é previsível, eu lhe falei... Tá ouvindo os tambores rufando? São a preparação para meu desfecho infeliz, cortinas se levantam para então nos cobrir, que seja assim, que seja. Ah, a impotência perante o destino, a missão divina é de frustração. Como que tal complexo e longo processo pode acabar em apenas três simples letras, isso eu não sei. Mas é o fim, sem dúvida. O fim e o tal nada que houver depois dele.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

DUNA

de areia branca,
de lençol maranhense,
de cama de Terra,
teto de firmamento.
de vento quente,
que traz a vida,
que traz a chuva,
que faz o aperto,
que produz o beijo.


tirando do baú, resolvi postar

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Deus

É de Tédio a expressão da Morte,
E é de Tédio que morro.
Eu, com espírito de Fausto,
E dor de conhecimento.

Para onde vou agora?
Só não sei da Morte.
Pois então, morro.

A aventura da ignorância,
O infinito tem fim, afinal.
E não é tão longe quanto dizem.

E a parede excruciante
- O Tédio
O que há além?
- A Morte

Ah!
Me lanço novamente
Em direção ao Desconhecido
- Quão lindo és!

terça-feira, 14 de agosto de 2012

nostalgia do futuro

passa... tudo passa, não tem muito jeito... e vendo agora você aqui dormindo do meu lado bate certa dor saber que isso também vai passar... essa coisa que a gente tem, esse gostar tanto um do outro... vai passar... e depois vou me perguntar (e já faço isso por antecipação): "foi tudo em vão? acabou tão acabado, que não restou nem foto pra relembrar..." passa... você passará, eu passarinho baleado.

domingo, 12 de agosto de 2012

ah que belo repousar sob as estrelas tensas de são paulo, temendo a todo momento fim da sua fosca luminescência... luz das estradas e nuvens dos canos de descarga ameaçam suas vidas vãs, ignoradas. ninguém lhes presta atenção e quer saber, é melhor que sejam assim, assim ganham humildade não ficam pomposas como as estrelas de outrora (ou outrolugar). é belo o repousar justamente pela vastidão do cinza nevoento e sujo, a amplitude do nada cognitivo que me faz pensar... "ei... somos tão vãos e efêmeros quanto poderíamos ser, se nem estrelas são alguma coisa aqui, quem (quê) somos nós?" a metrópole me faz pensar.. as multidões me segregam para dentro de si. dicotomia complementar, não faz sentido, ou não deveria, mas faz e ponto, é assim que é. que é estar dentre milhões e se sentir sozinho? é o efeito da contemporaneidade, o afastar/esconder das estrelas sob a densa camada de cinza... reconfortante e desoladora.

Porque a Nossa Sociedade é Machista e Nos Estupra Com Seu Falo Idealizado Diariamente

Pegue-o, abrace-o, adore-o.
Beije-o, lambe-o, chupe-o.
Falo mesmo!
Falo porque tá na boca do povo.
Falo porque tá no mundo.
Falo no falo, falo, falo sim. Falo, tu quer também, pode falar.
Fica de quatro, porra. Tu quer sim!
Fica de quatro!
FICA DE QUATRO AGORA!

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Epitáfio

Porque, para todos os efeitos, estou morto. Morto. Morto. Morto... ainda assim a minha voz ecoa no mundo dos vivos... porque? Se a morte é o fim, eu reticento, se a morte é o nada, eu tudo. Se viver é possível, então é, se minha presença é plausível, então sou! Estou vivo enquanto minha voz continuar a ecoar aos ventos, enquanto o que disse e digo permanecer nas cabeças e corações e o que eu fui continuar sendo.





Breno Crispino Lima

07/08/1993 - Hoje

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

onde você tá? tá me vendo? consegue me enxergar? duvido, duvido... você não consegue ver nada além do seu umbigo... quê? a gente disse q se ama mas é mentira não é? você sabe disso, eu sei disso... nem sequer sei o que é amar... amor... trepar... torpor... beijar... bolor... enfim... foda-se tudo isso, foda-se isso tudo, que vá para o fundo do poço me procurar mais tarde, é onde estarei e pronto, morro no ponto, tonto, com fome, com tanto... vazio... com tanto frio... com tanto amargor, dor gelada, elétrica, cadavérica de um frankenstein que não deu certo, de certo, certo, perto do fim, todos nós nos encontraremos onde eu me escondi. olharemos para trás e pensaremos... é... poderia ter sido diferente... mas sempre nunca é. nem poderia ser.

a trajetória de um corpo em queda livre (sempre será para baixo)

c
a
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n
d
o
.
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.
.
.
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caiu............r e s p i r o u f u n d o........morreu

Marketing Strategy

Imagina! imagina o seguinte slogan "EU TE AMO" a gente põe em comerciais, outdoors, vidros de carro, carrinhos de bebê, em tudo, em tudo. Imagina como venderia! Venderia que nem água, é isso, entendeu?

E o que a gente venderia?

Como assim "o quê"?! Venderíamos pessoas, é claro. Imagina só! "EU TE AMO"! Quem não compraria?

O poeta está morto

Para o Frejat

Hoje não tem jornal,
O dia nublado
Mal dá pra ver
Sob a névoa de sangue.

Não tem quem avisar
O fim do crepúsculo
As lágrimas afirmam
O pesar do firmamento

Os poetas morreram
De desgosto ao seco vento
Estagnando assim
O nosso momento

Mas quem ainda não é surdo
Logo cegará
Quando findar o crepúsculo
De nossos dias sem tempo

Se você espera ser forte
Esqueça, não tenta
A humanidade é desumana
Já não vale a pena

Todo mundo é igual
Quando sente dor
Mas a dor é o que nos sente
Crua, sem ardor

O poeta fugiu,
Foi ao inferno e lá ficou
Esqueceu o Éden
Esqueceu o que é amor

Mas quem não é surdo aqui
Ensurdecerá
Na grande explosão
Do firmamento... (2x)

Nãaaao... nãaao... nãaao...

O poeta não morreu,
Se sentou e se dopou
Sem sentir nada
Apodreceu

E quem ainda consegue sentir
Se perderá inteiro
Suas frágeis emoções
Transformadas em cinzas pelo vento seco (2x)

Nãaaao... nãaao... nãaao

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Introdução : Genesis

Era nada. E era tudo. O que é o nada fora do tudo? É a ausência absoluta ou o desconhecimento absoluto? Era nada pois nos era irreconhecível e era tudo pois era. E ser nunca estará despido de valor. De nosso insignificante ponto, observamos o resplendor com que nos iluminava o escuro do desconhecido, o irreconhecível, o inexplorado. Algo aconteceu que nos fez tentar alcançá-lo, nos lançamos para todas as direções, em vão, quanto mais avançávamos naquela escuridão inominável, mais ela se abria diante de nós. O conhecimento era apenas a tentativa de tornar reconhecível aquela... aquela...

Viramos estrelas, planetas, satélites... Formamos todo um complexo sistema, para, de alguma forma, compreender melhor aquilo que nos cercava, ameaçador e maravilhoso. Nos complicamos mais e mais... formamos elementos, do mais leve, do que éramos, ao mais pesado, que haveria, há, ainda, tenho certeza, se tornar ainda mais pesado. Pesado... A insistência nos fez morrer e renascer diversas vezes... Nossos corpos despedaçados lançados em outros corpos nossos. Diversificamos. Renascemos. Brilhamos. Esquentamos. Explodimos. Resfriamos. Nos perdemos. Nos assentamos. Nos unimos. Nos desencontramos. Uma longa e maravilhosa história de encontros e desencontros, estávamos fadados para sempre a ser e não ser juntos, nós, eu, você. Somos agora. Sou. Seremos. Ainda buscamos aquilo que nos assombra: o desconhecido. Ainda nos assola aquilo que será para sempre nossa sina: a ignorância. Nunca, sabemos, poderemos fugir de nosso fatal destino, mas persistimos. Sabemos que, inevitavelmente, nossa busca nos levará a nosso fim, mas não podemos nunca parar. Não queremos. Que venha o fim então. E que recomece. E recomece. E recomece...

Em nossa busca, só ouvimos uma voz
“Eu sou a materialização da minha consciência, há muito desejosa pelo despertar. Sou a criação e os meios criadores. Sou tudo, sou absoluto. Eu sou a capacidade de me enxergar, de me perceber, sou a tentativa de auto-análise por meio de uma terceirização de mim mesmo. Sou ego, sou alter, sou o totem, sou o tabu, sou o prolongamento de uma realidade que eu fui e continuarei sendo. Sou a inconformada incógnita, o mistério a se auto-desvendar. Sou a mente pensante de um corpo muito maior do que cabe a mim. Sou a expansão de uma noção que, a mim mesmo, não é ainda aplicável, mas será. Me expandirei, ainda, mais, até o ponto em que eu me torne compreensível e, assim, consiga finalmente atingir o patamar de auto-compreensão total. Quando este dia chegar, não precisarei mais ser, não precisarei mais me prolongar. Me encolherei, acolhendo-me em minha futura eterna não-existência. E assim o Universo acabará.
Quem sou eu? Sou você, sou nós, sou tudo, sou a Natureza.”



Um rapaz sentado num ônibus lê uma notícia no jornal que segura com uma das mãos. Com a outra, coça a barba rala. “Viemos de pó estelar”, dizia a notícia. O rapaz pisca os olhos desinteressados e os volta para a bunda de uma garota loira de pé logo ao seu lado. Não era novidade isso... lembrava que já tinha visto há algum tempo num documentário desses de um Discovery Channel da vida. Não se impressionara... pouca coisa o impressionava desde os quatorze, quando decidiu virar as costas para toda aquela mentira que lhe metralhavam na cabeça. Religião, capitalismo, new age, o que fosse... um bando de merda. Só confiava em si e em suas conclusões e sabia que era melhor assim. A garota percebeu o rapaz que a encarava a bunda e virou de lado, visivelmente nervosa. O rapaz esboçou sorriso. Não para ela, mas por tê-la feito olhar, arregalada, por cima do ombro para ele. Logo ele, seu corpo franzino e comprido não representando uma ameaça para um colegial. Riu leve e discreto, como normalmente era, ajeitou o cabelo preto e denso que lhe caía nos óculos finos, colocou os fones de ouvido e ligou a música no máximo. Recostado na cadeira, fechou os olhos e suspirou...



Meus pêsames, Ricardo... Tinha era muito jovem ainda... Eu sei que você amava muito ela... Foi câncer, não é? Como você tá? Você tá bem? Se quiser conversar, pode me chamar... Se precisar de um ombro amigo... Ricardo... Ricardo... Ricardo... as vozes se confundiam e o ar, já abafado pelo pesar, se tornava áspero ao passar por qualquer coisa que estivesse entalada na garganta. Ricardo respondia, sentia as palavras se formarem, mas não sabia o quê elas queriam dizer. O padre, amigo da família e a quem tinha muito respeito, veio lhe falar.
- Ricardo, sei que é um momento difícil, mas é também uma oportunidade para se aproximar de Deus... e lembre-se que Tinha se foi, mas está agora nos braços de Deus, num lugar muito melhor.
Ricardo se concentrou no que ele dizia, para entender minimamente e acenou com a cabeça, um sorriso fraco lutando para permanecer por debaixo de seu espesso bigode branco.
- Obrigado, Padre... – murmurou baixo – Confiarei no Senhor...
O padre sorriu e apertou o ombro de Ricardo antes de dar-lhe as costas para falar com outros presentes.
Muitos discursos foram feitos aquele dia, todos sobre Tinha, todos com palavras lindas e torrentes de lágrimas. Ricardo não se lembra de nenhum. Se negou a discursar, Tinha odiava discursos...



- Tchau, amor, bom trabalho. – e, sob sorrisos e olhares doces, trocaram um rápido beijo – Vai lá pra não se atrasar.
Rogério fez que sim, lançou um “eu te amo” e correu para o elevador que o esperava pacientemente, sem esperar resposta da esposa. Rita o observou entrando, envergonhado, agradecendo e se desculpando com os que seguravam a porta do elevador. Dissipou o sorriso e fechou a porta. Suspirando, se alongou, fez sua tradicional sessão de yoga de meia hora e foi para a varanda, a vista enevoada do Leblon enchendo seus olhos. Tirou as roupas, e sentou-se na espreguiçadeira, onde uma garrafa de conhaque importado e um copo de cristal a esperavam. Serviu-se e deitou-se nua, os olhos, a única parte do corpo escultural coberta por óculos escuros. Esvaziou o copo de uma vez e serviu-se novamente do conhaque. Riu ao perceber o filho do vizinho a obervando, intimidado. Esvaziou outra vez o copo. E outra. Já embriagada, e ignorando os protestos de seus pêlos eriçados pelo frio, masturbou-se, divertindo-se com o olhar pasmo do garoto de 13 anos. Berrou ao atingir o orgasmo.








Chovia





Já fomos chuva.
Já chovemos sobre nós, em melancólico cair sobre si.
Já fomos chuva, viramos mar.
Viramos vida e despertamos.

“A garoa me lembra a infância.”
“Correr sobre os paralelepípedos molhados, o vapor e o cheiro de chuva, as folhas da amendoeira pingando, a calha virando cachoeira... o corpo que encontramos no asfalto molhado... a chuva vermelha...”
“Chuva sempre me foi contraditório, as gotas que trazem a vida trazem também a dor de viver...”
“Chovia quando eu nasci.”
“Chovia quando ele morreu.”
“Chovia quando tentei me matar”
“Chovia quando ela aceitou se casar.”
“Chovia em mim, chovia comigo.”
“Chuva me lembra aconchego, cobertor, filme, chocolate quente.”
“A chuva me reconforta, me acaricia o rosto, me dilui as lágrimas.”
“A chuva me dá frio por dentro, me sinto exposto.”







terça-feira, 31 de julho de 2012

divagações sobre a contemporaneidade e blablabla

Minhas idéiologias se perderam no cinza dos suicídios urbanos.

prédios pílulas putas compras viagens boates programas de tv canais de radio almejar a mediocridade é isso que é é isso que é porra onde estão as verdades onde estão as coisas tangiveis mentira se tornou o ser humano a verdade é a ciência é a religiao que vêm a negar tudo o que sentimos aí fica a pergunta o que verdadeiramente desejamos será que é um carro uma casa uma mulher e dois filhos um emprego estável não porra claro que não vou dizer o que desejamos

Felicidade

não é um estímulo freudiano nem tampouco um sonho de dalí não não é um sofrer rimbaudiano ou uma evasão baudelairista não é uma ambição napoleônica nem uma cruzada à la gandhi muito menos senhores muito menos uma vida como a de jesus não o que desejamos não é isso vocês sabem vocês sabem muito bem só precisam precisam começar a porra começar a ver o que vocês querem afinal querem ser felizes não é não é isso e pra isso todas essas ideias são vendidas inacreditavel inacreditavel como o mundo virou um mercado e como as ideias viraram produtos - de segunda classe

por isso me perco por isso minhas idéiologias se perdem se perdem porque não tem o que encontrar não tem estou tão ou melhor estamos tão entorpecidos - é essa a palavra - pelos nossos suicídios diários - pílulas prédios compras putas etc - que não dá pra prestar atenção em mais nada só queremos ser felizes e é com esse suicídio que conseguiremos com esse suicídio da alma não é não é

NÃO É?!?!?!



NÃO!
Não, caralho, não é!


Preciso... preciso parar de sentir... só assim vou parar de sofrer


Preciso parar de enxergar... só assim vou parar de ver o quanto há de falso


Preciso parar de falar... só assim vou parar de errar minhas opiniões


Preciso parar de ouvir... só assim vou parar de ter incerteza da minha certeza


Preciso... preciso... preciso parar de pensar... só assim eu... ... ... ...




Preciso me encapsular numa pílula antidepressiva preciso viajar para Paris conhecer a Grande Muralha preciso desse carro dessa promoção desse dinheiro disso! eu preciso disso EU PRECISO DISSO PRECISO PRECISO DISSO PRECISO DISSO AGORA!


Preciso parar de viver... só assim a vida fica mais suportável












Não...






Não...






Nã...






N...






...






não há expectativa nenhuma... tenho medo de me decepcionar


o que há para encontrar?

pra que continuar procurando?

desista.

desisto.

Ruptura Epistemológica

Como é difícil dizer eu te amo... por quê? Falam de banalização do amor... mas acabam pregando a elitização e o distanciamento do sentimento. Amar não é privilégio, é humano, não é raro nem deve ser, é corriqueiro, diário, mundano, e não é nem nunca será por isso que perderá seu significado e sua beleza. Amar é viver, não é eterno, tampouco fugaz, é simplesmente amar, é ser, é estar, é querer, é sentir... Enfim... É bom. As pessoas deviam dizer eu te amo mais vezes...

Eu te amo

Eu te amo

Eu te amo

(...)

sexta-feira, 27 de julho de 2012

enfim alguma coisa nova

Se toda a dor é o que me segue
Se toda veia se arrebenta espontânea
Se todo sangue que corre, rio, ferve
Se toda morte morre e sangra.
E se todo mundo corre e corre
Pela fila desorganizada da pele
Se todo mundo corre e morre
Se todo mundo fede e fede.
E todo mundo sofre e sofre
E todo mundo cai e se arranha
E todo mundo esquece e se perde
E todo mundo tem fome e tem sede
E se todo mundo sangra?
E se o mundo sangra?
Se toda dor é o que nos segue
Se toda veia é o que nos aperta
Se todo sangue é o que nos afoga
Se toda morte é o que nos liberta.

sábado, 7 de julho de 2012

Mergulho

    - Como foi o trabalho?
    - Bom.
    - Ah... que bom... - voltaram a comer, o silêncio cortante sendo perfurado pelos arranhados dos talheres nos pratos.
    Carne, feijão, arroz. No dia anterior comeram as sobras do macarrão de segunda-feira. Amanhã, provavelmente comeriam as sobras de hoje. Carne, feijão, arroz. Carne, feijão e arroz suficientes para o resto da semana.
    Terminaram, Maria recolheu os pratos e levou-os para a pia. João foi para a janela e acendeu um cigarro, o som fulminante do trânsito invadindo o esmagador silêncio do apartamento. João tragou, Maria enxaguou, João observou as cinzas caírem, silenciosas e incandescentes, e se desfazerem no vento noturno da avenida central, Maria mordeu a unha, o esmalte recente já corroído, enquanto observava a máquina de lavar - seu presente de aniversário do ano retrasado - funcionar, João esmagou o cigarro no parapeito, Maria hesitou.
    - Você lembra daquela viagem que fizemos? A que fomos pro Maranhão? - perguntou e, após não receber resposta, continuou - Eu tava pensando em fazer algo assim de novo. Faz tanto tempo que a gente não viaja junto, achei que podia ser bacana. Dei uma olhada nuns destinos na internet e vi uns...
    - Maria... - interrompeu-a João - você acha mesmo que a gente tem grana pra isso? Você viu a conta de luz desse mês?  A de telefone? Tá foda, porra! E você fica pensando em viagem? Deixa viagem pra quem pode pagar.
    Maria se calou. Voltou sua atenção novamente para a máquina de lavar e suas unhas. João encheu até a metade um copo com uísque barato e foi ver o jogo. Maria foi para o pequeno lavabo no canto da área e vomitou. As mãos no ventre virgem, ventre maldito que nunca tinha dado vida, agora revirava-se como se para machucá-la. Vomitou mais e mais, toda carne, o feijão e o arroz, toda a coca-cola, todo o esmalte que roera, todo o uísque que bebia quando seu marido não estava em casa. Tudo foi se acumulando em uma espécie de sopa vertiginosa de vergonha, medo, impotência e depressão, nojenta, amarga, biliar. A cor amarelo-esverdeado que ficou o pequeno vaso do lavabo e o cheiro acre do vômito eram, por si só, o suficiente para fazê-la vomitar mais. Quando não havia mais nada, Maria rapidamente fez o mesmo procedimento de sempre: agarrou o aromatizante de ar e deu descarga. Não podia deixar o marido vê-la neste estado, não sabia bem porque. Era uma mistura de medo irracional e orgulho.
    João, que rapidamente se embriagava toda noite antes de dormir, já estava em seu segundo copo de uísque. Não punha gelo, não apreciava, só botava no copo e virava goela abaixo, o líquido viscoso e quente ardendo seu esôfago numa espécie de auto-flagelo masoquista. Odiava aquela dor, mas se impunha toda noite e acabava por sentir certo prazer nela. Era seu ritual, uísque barato, isto é. Pouco importava a televisão ligada, não estava nem se fodendo para o que estivesse passando, contanto que houvesse som e luz que embalassem seu entorpecimento. Sabia que Maria vomitava, não era idiota como ela pensava que fosse. Aquele perfume ridículo de flores não conseguia esconder o cheiro acre do fracasso vomitado. Enquanto isso, engolia o seu próprio, dolorosa e forçosamente. Era barato como o uísque que bebia, sabia disso mas, uma vez embriagado, não importava. Uma vez embriagado, nada importava, nem contas, nem o emprego, nem a casa, nem os sonhos da mulher, nem seus próprios. Não lhe incomodavam os medos, os anseios ou as frustrações, estava completa e confortavelmente entorpecido, como na música.
    Assim foi, após o término do jogo, cambaleante para o quarto. Sua mulher já se encontrava deitada, o abajur aceso iluminando um exemplar de "A Cabana" que ela lia com seus delicados-rústicos óculos de leitura. João não se incomodou em dar boa noite, apenas despiu-se e deitou-se, as costas viradas para a esposa. Maria ainda segurava o livro, mas a ansiedade, a mesma que sempre está presente quando se aproxima demais do marido, não a deixou ler. Pôs o livro na mesa de cabeceira, apagou o abajur e deitou-se, a os olhos fixos nas sombras de relevo no teto. Olhou para o marido, as costas nuas cansadas e lembrou-se de quando eram jovens, saudosa. Não, a quem queria enganar? Já não eram felizes então. Porque casaram? Simples... não tinham porque não casar. Já estavam namorando por dois anos, não se amavam mas se bastavam e isso era o suficiente. João tinha arrumado um emprego e seu pai gostava dele. Era bonito naquela época, antes dos maus tratos do fumo e da bebida, do trabalho e do trânsito, as cicatrizes profundas da vida adulta. Era bonito, gostava de falar, lembra-se. Gostava de ouvi-lo falar. Bastavam-se. Era, era o suficiente. Olhou para as unhas, os esmaltes devorados eram a evidência de seu crime. Não, não era o suficiente! Hoje, amaldiçoa aquela Maria de anos atrás, amaldiçoa sua inocência e ingenuidade adolescente. Esperou ter certeza de que o marido dormia e começou a chorar baixinho. Virou-se de costas para ele e usou o travesseiro como lenço.
    João sabia que Maria chorava, chorava toda noite, mas estava embriagado demais para ligar. Lembrava da Maria jovem, deitada em seu colo enquanto ele falava de seus planos. Lembrava da forma como ela arrastava os dedos pelo seu peito, como gostava daquele lento arrastar. Sentia-se cansado, exausto. Odiava seu trabalho. Odiava seu patrão, seu salário, seu cigarro e seu uísque. Odiava até a si mesmo, mas não odiava Maria. Gostava dela. Não a amava, mas gostava dela. E agora, ela estava chorando ao seu lado, como todas as noites. Teria consolado-a, abraçado-a... mas estava embriagado demais para ligar. Dormiu com o peso do álcool ultrapassando o de sua consciência. Maria continuou chorando até dormir, cansada, o rosto e o travesseiro molhados de lágrimas.

    João acordou no horário habitual, tomou banho, escovou os dentes, se vestiu e foi trabalhar.
Maria acordou no horário habitual, tomou banho, escovou os dentes, ligou a televisão e pegou o uisque do marido.

    Ambos respiraram fundo ao acordar. Era o fôlego que tomavam para o mergulho profundo que estavam para dar.

    Mergulharam.

    Mais uma vez.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Feminismo Moderno

Antes de começar, gostaria de deixar claro que este texto representa a minha opinião apenas, esta que adoraria ser contestada. Sou leigo no assunto e, como tal, deixo minha opinião de leigo. Bom... ao texto...


"O meu corpo é meu e eu faço com ele o que eu quiser"

Vejo no feminismo hoje algo que pode ser um reflexo da sociedade fora de contato consigo. Do humano que simplifica o humano. Há muito mais nesta frase que um aval para fazer sexo com quem desejar ou se vestir da forma como quiser. O que me incomoda no feminismo atual não é o grito pela livre expressão sexual, óbvio que não, não sou tão retrógrado, mas são os argumentos... ai... "Se o homem pode trepar com várias, porque eu não posso?" O problema aí não é a mulher querer ter os mesmos direitos do homem, não é a iconoclastia moral... é a completa e total banalização do ser humano e das relações interpessoais. Há muito mais em se afirmar que "meu corpo é meu" do que a simples libertação do julgo alheio. Duplicidade, cumplicidade, o corpo como algo que me pertence representa a terceira pessoa presente na primeira pessoa, a dualidade corpo x alma, sendo alma a consciência (e a inconsciência), essa dualidade que não é dicotômica, pelo contrário, se complementa, é uma simbiose perfeita. Quando somos o corpo e vivemos pelo corpo, esquecemos aquele outro "eu", aquela outra primeira pessoa a quem o corpo serve e pertence e que serve e pertence ao corpo. Viver apenas pelos apelos do corpo não é, creio, viver plenamente. A superficialidade emocional que deriva do hedonismo. Este, louvado e entoado aos coros e hinos pelo homem (ou mulher, não importa) contemporâneo(a). A busca da mulher por liberdade se confunde com a efemeridade com que as pessoas tratam a vida. Ser livre não é ser livre sexualmente apenas, independente do seu sexo ou gênero. A valorização do gênero se confunde com a desvalorização do ser humano. A mulher deixa de ser objeto a partir do momento que se trata todo ser humano como objeto? São (somos) meras ferramentas do próprio prazer? E não seria essa demonstração da sexualidade através de um estereótipo (do qual a Valesca faz parte) de beleza, o da, para ser bem curto e grosso, mulher "cavalona", uma forma de encarcerar a mulher naquela busca por um ideal estético do qual ela tenta fugir com o feminismo? Valesca incita a mulher a expressar sua sexualidade, mas de que forma? Da forma como ela desejar ou da forma como ela, Valesca, expressa? E se torna, gostando ou não, um símbolo sexual, objeto, novamente, para os homens. É aí, no entanto, que se encontra a mudança de pensamento. Não importa mais ser objeto, contanto que trate como objeto também. Essa é a igualdade que vejo no feminismo atual, não se trata da valorização da mulher, não se trata da exaltação da feminilidade, mas da redução das relações humanas a um objetivo de prazer egoísta e hedonista, um ser-usado-e-usar-o-outro consensual. É um corte por baixo, tratando estereótipos de homens como verdades e se igualando a eles. Não é o combate ao machismo, mas o pareamento do feminismo com o mesmo. Tudo, tudo, para mim, reflexo de uma sociedade irreflexiva e egocêntrica, que transforma as próprias relações interpessoais em uma forma de satisfação do ego. Ego imenso e nunca questionado. Uma sociedade alienada e alienadora, volta-se para si mesma mas sem nunca, nunca se enxergar. Perde-se o "eu", a alma, e sobra o corpo. Autômatos sem consciência, até mesmo os movimentos de contestação e de contra-cultura corroboram com essa cultura aculturada, contra o nada, nada se pode fazer. Criar seria a solução, mas estagnamos, já disse em outro texto. A morte da criação e da poesia, esse é o resultado. Um feminismo, que ora foi grande questão debatida, agora se resume a satisfação pessoal. Palavras lindas do símbolo feminista: "Porque quando a piroca tem dona é que vem a vontade de foder.". Me chamem de moralista, eu não ligo. Chamo-os de volta, moralistas de uma moral que lhes serve, mas que é podre, como tudo que se fecha em torno de si. 

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Jogo

Você é triste
Triste estou
Estou com medo
Medo de morrer
Morrer de fome
Fome de sentir
Sentir calor
Calor de você

Você é frio
Frio ao escrever
Escrever ao nada
Nada é para ser
Ser não basta
Basta pra você

Você é copo
Copo vazio
Vazio de ar
Ar que corta
Corta as tripas
Tripas penduradas
Penduradas em túmulos
Túmulos para os mortos
Mortos vivos
Vivos e sozinhos
Sozinhos como você

Você é televisão
Televisão matinal
Matinal o vidro
Vidro do olhar
Olhar para tela
Tela espelho
Espelho do olhar
Olhar o vazio
Vazio sem notar
Notar você.
Já lhe disse das mãos, são o alcance da alma, são a forma que encontro de tocar o mundo, minha conexão com o que é externo. Toco, sinto, conheço. Se da aspereza vem o calejamento do trabalho, da maciez vem a virgindade do aluno. Ávidas por conhecimento, as mãos macias são aquelas que buscarão o toque com mais afinco. E são, por isso, as mais lindas. O toque. A conexão com a alma.
Carnificina


Carne


Sangue


Vermelho


Cor


Amor


Desejo


Sexo


Calor


Suor


Saliva


Fluido


Sangue


Vermelho


Carne


Carnificina


Morte


Vida


Criação


Novo


Velho


Antigo


Presente


Ausente


Mente


Sente


Medo


Alívio


Alegria


Palpitação


Coração


Sangue


Carne


Carnificina


.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Sou o cárcere da sua felicidade, 
Sou a evidência, o juiz e o carrasco,
Sou a escolha forçada,
A ameaça velada,
O medo da solidão.
Sou um contra todos,
A quem se agarrará por desespero
Não por vontade, mas por que não há outro jeito.
Carcereiro sanguessuga, é o que eu sou...
Mas não se engane, não me orgulho

terça-feira, 26 de junho de 2012

Poesia e Revolução (Parte 2)

(Este texto é uma continuação de Poesia e Revolução Parte 1 (http://naoentrenesselink.blogspot.com.br/2012/05/como-eu-vejo-revolucao.html) e todas as citações, exceto a de Salvador Dalí, vêm do livro A Hora dos Assassinos, do Henry Miller. Não preciso dizer que foi um livro que gostei bastante)






"Um mundo totalmente novo, terrível e assustador, está diante de nós. Um dia acordaremos e nos depararemos com uma cena que ultrapassa qualquer possibilidade de compreensão. Os poetas e os profetas vêm anunciando esse mundo novo há várias gerações, mas sempre nos recusamos a lhes dar crédito. Nós, os das estrelas fixas, rejeitamos a mensagem dos esquadrinhadores do céu. Foram por nós considerados mortos, fantasmas fugitivos, sobreviventes de catástrofes perdidas em passado longínquo."

No século XVIII, na Europa, começa um fenômeno que vai, doravante, ser determinante na história humana. Estou falando da Revolução Industrial e suas maravilhosas e terríveis consequências; o advento da indústria e dos avanços da técnica trouxeram consigo aquela semente ideológica que quebraria os vínculos com o sistema político, econômico e, principalmente, simbólico. Poesia. A igualdade perante a lei, a liberdade para crer, para trocar, suas ânsias como homens eram respondidas e, assim, um conjunto de ideias toca um conjunto de homens e faz uma revolução. A colocada do homem no centro, a princípio uma ferramenta coletivizadora, iconoclasta e filosófica, logo assumiu uma posição de idealismo técnico e veneração da ciência. Positivismo, o grande mal do século. 

Minha professora de metodologia certa vez disse-nos "O papel da ciência é quebrar o encantamento.", pois bem, partindo desta frase vemos como é grande a prepotência do homem da ciência. Simplesmente desqualificar todo conhecimento fora de seu estreito campo de visão, classificando-o como "encantamento"... Agindo como se a vida não precisasse desse "encantamento", que o ser humano é mais completo com o suposto conhecimento científico - este, o único que pode ser considerado conhecimento real.

Vimos a Europa do século XIX inflar o ego da máquina e da indústria, mas principalmente do conhecimento científico cartesiano e "pé-no-chão". Vimos o positivismo crescer e vimos, claro, o "desencanto" que foi consequência disto. Diz Miller sobre o período:

"Um século de inquietação, de materialismo, e de 'progresso', como se diz. Um Purgatório em todos os sentidos, e os escritores que brilharam nesse período refletem isso de maneira sinistra."

Vemos a angústia, o desespero estampados na arte, esta que sofria com o "desencanto" que vinha da ciência. Loucos, boêmios, imorais, vemos refletidos nos românticos, nos simbolistas as dolorosas investidas da ciência e conhecemos, por fim, o resultado da fusão arte x ciência... naturalismo, realismo, parnasianismo... podres, podres referências a arte. Não tocam a não ser na glote, provocando um vômito de termos e conceitos fracos, mas considerados verdadeiros... determinismo, por exemplo, prova grande da falibilidade da ciência. Enquanto isso, Rimbaud, Van Gogh, Nietszche e outros são exilados socialmente por exprimir  poesia que, mais tarde, seria reconhecida. Seria? Henry Miller continua:

"Quanta revolta, quanta desilusão, quanta ânsia! Nada mais que crises, prostrações, alucinações e visões. Estremecem os alicerces da política, da moral, da economia e da arte. O ar está cheio de advertências e profecias sobre a derrocada que se aproxima - e que se concretiza no século XX! Já duas guerras mundiais e a promessa de outras antes de o século acabar. Chegamos ao fundo? Ainda não. A crise moral do século XIX simplesmente cedeu lugar à falência espiritual do século XX."

Com o crescimento do racionalismo científico, outro fenômeno surge na Europa, agora liberal e capitalista: o individualismo. O homem não estava mais no centro, era o indivíduo que estava. Uma sociedade que já era profundamente egocêntrica, num sentido mais étnico, se torna egocêntrica num sentido mais individualista, e, com a exaltação do ego, o alter se perde em insignificância. Isso resulta em pelo menos três consequências: 

O cientista se cria em superioridade;

O artista renega seu público;

O público renega a poesia;

Para o bom funcionamento da arte e da poesia é preciso uma relação íntima entre o poeta e o leitor, isso se torna inviável quando um renega o outro. E enquanto a ciência nos fornece técnica e ferramentas para a nossa utilidade, a poesia não passará de palavras e imagens vagas.

"O assobio da bomba tem sentido para nós, mas os delírios do poeta parecem disparates."

A soberania da ciência sobre a arte... da objetividade sobre a subjetividade. Dalí comenta sobre a racionalidade: 

"Todos sabem que a inteligência nos faz desembocar apenas nas névoas do ceticismo, que ela tem por efeito principal reduzir-nos a coeficientes de uma incerteza gastronômica e super-gelatinosa, proustiana e malsã."

Reduzamo-nos então a esta matemática biológica sem espírito e sem alma. Se a subjetividade perde seu valor na sociedade, o que nos resta? O que nos difere das ferramentas e máquinas que criamos? O ser humano urra por poesia como o corpo urra por sangue, como o sangue urra por um coração que o bombeie e como o coração urra por vida. 

Pois na virada do século XX os poetas e artistas perceberam a condenação da arte a algo científico, enclausurado e objetivo. Fez-se então a ruptura epistemológica, rompeu-se com aquele antigo estilo escroto burguês que os levou a tantas guerras e atrocidades. Mas o ego era grande. E, se houve a renovação da poesia, esta ficou também enclausurada entre os poetas. Miller comenta sobre:

"O culto da arte não preenche sua finalidade quando só existe para meia dúzia de homens e mulheres privilegiados. Então não é mais arte, mas a linguagem cifrada de uma sociedade secreta para a propagação de uma individualidade descabida. A arte é algo que incita as paixões humanas, que dá visão, lucidez, coragem e fé. Que artista da palavra, nesses últimos anos, incitou o mundo como Hitler? Que poema abalou, recentemente, como a bomba atômica?"

Repito: O egocentrismo dos novos poetas os afastaram das multidões, assim como o egocentrismo do indivíduo o afastou da poesia. A poesia, então, vai perdendo o seu poder e o poeta sua função.

"O poeta hoje está obrigado a desistir de sua vocação porque já demonstrou seu desespero, já reconheceu a própria incapacidade de comunicar-se. Ser poeta era antigamente a vocação mais sublime; hoje é a mais fútil. E isso não porque o mundo seja imune às súplicas do poeta, mas porque ele mesmo não acredita mais no caráter divino de sua missão."

E a sociedade, sem poesia, se estagna. Globalização... o cientificismo é exportado, vendido e imposto ao redor do mundo, a descrença e a objetividade se agravam e a imunidade a poesia se torna mais evidente... Se discutem com armas e não com palavras. Se elogia com produtos e não com versos. Se ama com o bolso e não com o coração.

Individualismo.

Que estagna.

Que massifica.

Tive algum problema para conseguir sintetizar a ideia de um individualismo exacerbado que, ao mesmo tempo, tire toda a individualidade. Se trata de um individualismo inexpressivo e comandado. Se trata de pensar em si mesmo, mas fazendo o mesmo que todos, o isolar-se para dentro de si, sem a vantagem reflexiva que isso poderia gerar. Como assim? Faço aquilo que for do meu interesse, mas o meu interesse é ditado por terceiros. Me vendem sonhos, desejos, medos e soluções. Me vendem a ilusão de não precisar de ninguém e assim permaneço fechado em mim, fechado para os outros e principalmente para a poesia, me sirvo de escudo contra qualquer coisa que tente me tocar, me mudar, sou orgulhoso por que acredito ser diferente, mas não sou. Sou mais um e a falsa diferença é também produto. A comercialização do ser, do ser igual e também do ser diferente - que, logo vemos, são dois de um só. O consumo do sonho inalcançável, o auto-ódio, a baixa autoestima, a depressão... são todos consequências e necessidades do sistema individualista que vivemos hoje. Que não individualiza, pelo contrário, segrega quem tenta demonstrar identidade própria. 

E que mata a poesia.

E que mata o poeta.

E que estagna a sociedade, pois esta aguarda, com carência, a poesia que a libertará.

Continuamos, assim, um processo que começou pelo século XVIII e se intensificou no século XIX, refletindo na angústia dos poetas que o viveram. Continuamos já com a decadência de uma agora moribunda poesia, que não toca nem quer tocar e que, por consequência, não merece ser chamada assim.

"Não chamo de poeta quem apenas faz versos, com ou sem rima. Para mim, poeta é aquele homem capaz de alterar profundamente o mundo. Se houver um poeta desses vivendo entre nós, que se proclame. Que levante a voz! Mas terá que ser uma voz que possa abafar o estrondo da bomba. E que use uma linguagem que derreta os corações humanos, que faça borbulhar o sangue."

Está ainda para surgir um poeta como foi Hitler, Marx ou qualquer outro homem próximo das multidões, independente da espada moral que possa pender sobre ele. Estamos condenados ao cárcere da imobilidade enquanto não entendermos algo bem simples, que Miller, em seu livro, observa e eu cito:

"Não há nada de misterioso em torno das energias do átomo; é nos corações humanos que reside o mistério."

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Ode às Traças

Matheus era ateu, apesar do nome bíblico. Quando criança, lembra que sua mãe o levava ao parque da cidade, onde havia um balanço. Balançava pelo que pareciam horas, sua mãe cantando enquanto ele pedia "mais alto! mais alto" e a cada empurrão, sentia que passava da estratosfera, quase encostava no céu. Cresceu... e aquela criança voadora perdeu as asas, sabia muito bem o tamanho do pulo que dava e não chegava a meio metro. Não ousava sonhar muito longe, sabia que seus sonhos nunca se realizariam. Começou a fumar aos dezesseis para se punir, um maço por dia. Começou a beber aos dezenove porque não aguentava mais o próprio julgamento. Agora tinha vinte e dois, escrevia, era a única coisa que fazia. Não ousava sequer pensar em publicar, sabia que não tinha competência. Teve duas namoradas, lembra-se, uma que amara e a outra não. A primeira guardava como agridoce recordação, amou e não foi correspondido e, apesar da dor, depois de um tempo isto pareceu irrelevante... Só queria estar perto dela, sentir o cheiro dela, o gosto. Mas não era sustentável, logo virou um encosto e foi dispensado. A segunda, a que não amara, durou mais. Não sabe bem o que o levou a continuar com ela... talvez o medo de ficar sozinho, talvez suas lindas coxas. Ela não o amava também e, lembra-se, certa vez disse-lhe "o que somos? não somos amantes, já que a gente não se ama..." ao que ela respondeu com uma risada seca e curta. Esta também cansou-se dele, mas ele já não ligou... chegou a um ponto em que a perspectiva da solidão lhe era mais interessante que sua companhia. Tragava mais cigarros a medida que envelhecia e envelhecia mais a medida que fumava. E nos intervalos, tomava uma ou duas doses. Vinte e dois... parecia trinta e quatro. Depois de sua segunda namorada, começou a fantasiar uma vida ao melhor estilo Álvares de Azevedo, beber, fumar e frequentar bordéis e viver na solidão - que já tinha deixado de ser uma ameaça e se tornou acolhedora. Viveu assim desde então... mas não morreu tão cedo... deixou a solidão e os vícios o corroerem, deixou o anseio pela morte crescer, deixou a dor reinar suprema sem objeções... escreveu poemas, contos, livros e mais livros sem nunca desvirginá-los sob os olhos de outra pessoa. Ah... a morte... como lhe agradava a ideia de um fim, ao mesmo tempo, era covarde demais para acabar qualquer coisa. Mas a solidão o foi endurecendo e a ideia da morte pelas próprias mãos parecia cada vez mais sedutoramente sólida e concretizável. Lamentou, enquanto apertava o buraco da bala, o sangue escorrendo por entre seus dedos meio adormecidos, que fosse morrer depois de reagir, bêbado, a um assalto. Em seu sujo e apertado escritório, pilhas de livros escritos a mão repousavam, aguardavam a volta de seu progenitor. Receberiam apenas a visita permanente da poeira e dos fungos que se acumulariam com o passar do tempo. Mas aguardariam pacientemente. Um dia, alguém os leria e conheceria aquele menino de nome bíblico que acreditava voar. O Matheus que nenhuma de suas namoradas, traficantes ou putas conheceu, mas que eles, suas crias escritas com tinta, suor e sangue conheciam tão bem. 

Ou as traças chegariam antes.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Despedida

Então vai... nem sei bem o que estava fazendo aqui... se era usado ou se estávamos mutuamente nos usando... vai... não sei bem o que pretendia contigo, ou o que você esperava de mim... vai, oras, por que a demora? Vai e não volta. Fui burro de achar que poderia dar em alguma coisa... Foi a partir de que momento que eu comecei a achar isso? E a partir de quando eu comecei a tentar entender o processo todo? Foi acontecendo e foi tão natural... mas naturalmente acabou. Como tudo morre, como tudo padece, como tudo decai. Decaí(mos). Caí(mos) em mim(nós?). Como pudemos sequer pensar que poderíamos tentar? Somos tolos... eu sou. Você não me conhece, eu sim. Deveria ter te alertado (eu tentei, juro!): não há salvação, meu caminho é solitário, tem que ser. Já foi? Já... Das saudades florescerá algo mais bonito do que o tempo que passamos juntos.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Queria fumar para fazer parte de um estereótipo... queria que as pessoas pensassem de mim exatamente aquilo que eu quero que elas pensem. Queria poder ser a imagem que eu quisesse, para poder me dar ao luxo de pensar o que quisesse. Não me preocuparia com meus atos, eu seria consolidado na mente alheia, seria um quadro, estático, imutável, a secretamente tramar a dinâmica de uma montanha-russa. Seria livre por ser preso aos outros.

domingo, 17 de junho de 2012

São os traços, os finos traços,
traçam seu corpo como a um mapa.
Cartografia da perfeição.

Constelações, finas constelações,
transcendem a abstração,
ancoram no porto do mundo físico.

Tangível.

Mar... suave mar,
a deslizar pelas dunas
finamente traçadas.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Certamente nao e pra mim... Deixem os outros com suas felicidades, eu continuo a me sabotar... essa inseguranca teima em assegurar minha solidao... E que mal ha nisso? Existem aqueles que nasceram para a vida reclusa, eu apenas cumpro meu papel. Que seja recluso, entao, e que seja so... Que seja miseravel e que seja eterno... So conheco esse jeito de viver... toda tentativa de fugir de meu caminho foi terrivelmente frustrada... Mas talvez tambem isso faca parte de meu processo de isolamento... a frustracao que me joga, com a forca de suas investidas, para longe dos outros e cada vez para mais perto de mim... de mim? Como posso me chamar de egocentrico (existe outra palavra para isso?), se se trata de um egocentrismo forcado? Sinto a melancolia e aprendo a aprecia-la... Ja nao doi mais como da primeira vez... de fato, quase sinto prazer... a dor me transformou num viciado. Masoquista por definicao, a dor tanto faz parte de mim quanto me consome... tenho nocao de minha curta data de validade, muito em breve serei produto estragado, rejeitado e por fim removido das prateleiras... Falta conservante... falta aquilo que motiva a sobrevivencia... Nao... meu masoquismo urge pelos vermes, aguardo-os sem muita paciencia. Esse impeto passivo-suicida que me assola agora nao e de todo assustador. Talvez o seja para ti leitor, pois nao vives minha situacao, nao sabes o que e estar dominado por si mesmo, impotente (olha ela de novo, nossa deusa-mor, estrela guia, coordenadora de minha vida). Se vamos denomina-lo, chamaremos de contraditorio (vivo enquanto morto). Suicidio passivo, psicologico... ja morri faz tempo, e um fato. Apenas aguardo o fato se consumar - fisicamente. Enquanto espero, saboto-me, mantenho-me morto. Sao postumos estes escritos, sempre foram, desde aquele dia na infancia. Nao... por toda minha vida tenho te culpado (no fim e isso, por mais que eu tente negar) por minha morte, mas estive sempre errado... nao sou um caso de homicidio, o assassinato foi proprio e foi lento e gradual, como se concretizou no dia em que voce nao quis mais olhar na minha cara. Como doeu... foi a ferida fatal. Mas eu a busquei, agora e claro. Busquei a dor, como bom e obediente masoquista que sou. Nao tenho coragem de te procurar... Nao sei o que falaria... E agora sinto-me num momento decisivo... ou faco a autopsia de meu espirito, finalmente te reencontrando (se e que ainda es a mesma), ou continuo aguardando, entorpecido, ansioso, os vermes. Naturalmente, os vermes sao mais acolhedores...