segunda-feira, 10 de setembro de 2012


IX - O abismo

Pascal tinha um abismo, com ele em movimento.
- Pena! tudo é abismo - ação, desejo, sonho,
Palavra! E no meu pelo que de pé eu ponho
Muitas vezes do Medo ouço passar o vento.

Ao alto, abaixo, além, a profundeza, o mar,
O silêncio, o espaço, horrível, cativante...
Em minhas noites Deus, com mão conciliante,
Desenha um pesadelo vário e singular.

Temo o sono assim como se teme a voragem,
Cheia de vago horror, e com perdida margem;
Pelas janelas só o infinito vou ver,

Meu espírito sempre habitado de espasmo,
Do nada inveja mesmo é o insensível marasmo;
- Ah! Não sair jamais do Número e do Ser!

Baudelaire, em As Flores do Mal (tradução de Mário Laranjeira)

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