quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Acerca de Deus e pãs

Até algum tempo atrás, caso você me perguntasse se eu acredito em Deus, eu não apenas diria que não, como riria da ideia de sua existência. No entanto, fui aos poucos passando por uma transformação que mudou completamente meu modo de pensar, passando, a princípio a considerar a existência, ou melhor, não descartá-la. Oras, raciocinemos... qual a grande diferença entre crer que Deus existe e crer que Deus não existe? Só pelo fato de eu acreditar em sua não-existência, eu já levo em consideração sua existência, tornando-o um fato dubitável, mas possivelmente existente. Afirmar categoricamente que Deus não existe é tão estúpido quanto qualquer afirmação absoluta. Eu era estúpido. Eu sou estúpido, mas era ainda mais. Passei, então, a não me chamar mais de "ateu" com toda pomposidade e orgulho. Ainda não deixava Deus nenhum fazer parte de minha vida, mas não porque ele sem dúvida não existia, mas porque não faria diferença. Será?

Foi neste último sábado, eu fui assistir ao filme "Nosso Lar", baseado no livro psicografado por Chico Xavier do espírito André Luiz. Não vou dizer a você que eu acredite na psicografia, ou em espíritos... seja como for, o livro é absolutamente lindo. E a história compensa pelas falhas cinematográficas. É um enredo para te fazer pensar, não para te entreter, então não espere explosões, tiros e etc... Enfim, estava eu vendo o filme, e talvez eu pudesse ter jogado os 105 minutos do filme fora como uma forma de demagogia e moralismo, se não tivesse ouvido uma única frase. Uma frase apenas, dentre milhões de frases, que conseguiu chamar minha atenção. Disse o governador a André Luiz:

"- Quando você estava lá deitado, André, você falou com seu coração, você falou com Deus."

Era algo assim... não lembro exatamente, mas a essência é essa. Veio quase como um clique em mim e eu percebi que olhava na direção errada. Não era Deus que eu negava, mas uma imagem estereotipada e  preconceituosa de um ser divino criador de tudo e que pune quem n obedecer a Ele. Não é isso... acho que uma busca por algo maior, algo para se guiar, não importa o que seja, é natural ao homem. Alguns vêem Deus em animais, outros em fenômenos naturais... eu, no entanto, percebi outra coisa. Deus não é de fato algo físico... materializável com coerência, não é um velho barbudo sentado num trono. Não, eu vejo Deus como o sentimento que brotou em André Luiz, vejo Deus como uma sensação, um estado emocional, um Deus interno muito mais que externo. De fato, cabe ao próprio homem externar este Deus, que não é Deus, mesmo, mas uma característica do homem. Ei, não estou botando o homem como Deus, estou botando o homem como portador de um divino que nada tem a ver com divindade, é divino em sua essência, não em sua forma.

Deus é amor, foi a conclusão que eu cheguei. Justamente porque não existe nada tão poderoso, incondicional, despretencioso e além da compreensão do que o amor. Você não sabe o porque, só sabe que ama, só sabe que faria qualquer coisa para proteger esse amor. Colocaria o bem dele (do amor) a frente do seu. Se doar, sem esperar nada em troca, o mais forte sentimento de empatia... isso é Deus, a bondade no (coração?) ser humano. O altruísmo. A caridade e não a demagogia. Pelo menos foi que eu entendi. E, ao compreender isto tudo, uma sensação de bem-estar me invadiu, talvez pelo prazer de uma nova descoberta, talvez, segundo diria Jung, fosse a sensação da materialização da imagem de Deus na minha mente. De uma forma ou de outra, Deus sendo o amor, a fonte altruísta do ser humano, me parece uma teoria satisfatória. E bem plausível também. É um Deus, que de fato, não criou o Universo, mas cria muita, muita coisa. Está em sua onipresença, algumas vezes latente. Possui um poder onipotente, que é o prórpio poder do amor, um poder que já se mostrou capaz de verdadeiros milagres.

Não é um Deus que eu possa rezar, nem seguir regras para deixá-lo feliz. Porque não é um Deus que me julgue, é um Deus que só aparecerá, caso eu realmente chamá-lo, aceitá-lo, praticá-lo, externá-lo. É um Deus que me faz perceber que o verdadeiro perdão vem de mim mesmo em primeiro lugar. Que a sensação boa que ele traz, é consequência das boas ações que fazemos.

É engraçado pensar que eu imaginei tudo isso em uma fração de segundo. Acho que talvez isto já estivesse em mim, adormecido. E foi preciso o governador do Nosso Lar para acordá-lo.

Talvez você me pergunte agora: "Tá, e o que diabos mudou?". Bom... não mudou nada, eu acho. Vou seguir a vida como seguia... mas acho que me sinto mais leve agora... posso ainda não ter ideia do que vai me ocorrer após a morte - provavelmente a decomposição - mas sei que eu tenho um Deus em que confiar, no Amor dentro dos homens... e acho que me dá certa esperança saber que todos possuímos este Deus dentro de nós, por mais que neguemos, por mais que ele esteja latente, por mais que queiramos contrariá-lo, Ele está lá.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Lar Doce Lar



Não há lugar como o lar.



                         Quero voltar para casa.


Que coisa estranha é esse apego a um lugar, não? O que chamamos de casa, lar, ou qualquer outro nome que você possa eventualmente chamar... Porque, para nós, ela deixa de ser uma simples moradia? Porque passamos a nos identificar nela? Torná-la parte de nós mesmos e nós parte dela? Porque nos sentimos seguros dentro dela, mesmo se não estivermos? Porque a necessidade de clamá-la para si? Lar pode ser um apartamento, uma casa ou mesmo um país. Sabemos que pertencemos àquele lugar e que não poderíamos ser de nenhum outro. O que leva um brasileiro morando na Europa, mesmo ganhando muito mais e vivendo melhor lá, voltar para o Brasil? Ou um judeu, cuja família já vive gerações em um país, querer voltar para Israel? Vemos nossas origens em nossa casa, nos vemos nas nossas origens. Quem nunca quis saber quem é de fato? Saber de onde veio? Se conhecer? Vemos em casa o mais próximo de nós que podemos encontrar. Às vezes tentamos fugir... Mas o apego a casa é grande. E porque o sonho da casa própria? Não seria fugir das origens? Fugir da sua história? Não, creio que não, seria o inevitável desejo de construir você mesmo uma história sua. E deixá-la para seus filhos. A casa não é um simples abrigo, é um santuário, onde você pode mesmo nas piores situações sentar-se e descansar, descarregar o pesado fardo da rua, do dia-a-dia, do trabalho. Em casa, você pode chorar, xingar, ser você mesmo sem ter ninguém para te julgar. Vemo-nos em casa, porque nossa casa, nosso lar, é onde abrigamos nossos mais profundos segredos, sentimentos, ambições... Vemo-nos em nossa casa, porque ela é moldada de acordo com nossa personalidade.


E quem não tem casa? Quem não tem lar? Quem está à procura de um lugar que pode chamar de seu? E quem foi tirado de casa a força? A sua propriedade tirada desta pessoa sem aviso prévio? Ou mesmo com aviso prévio? Esta pessoa deve lutar pelo que é seu? Esta pessoa deve retaliar? Esta pessoa deve agir passivamente e viver sem lar? Aquele que nasceu sem terras deve morrer da mesma forma? Deve tentar conquistar algum lar, mas como? Se nem casa eles tem, vão ter como estudar? Arrumar um emprego? Comprar enfim a tão sonhada propriedade?


E aquele que tem mais que abundância de terras, não por mérito próprio, não foi ele quem conseguiu adquirir tudo aquilo, foram os avós dos avós dos avós dele, aqueles que ganharam estes feudos para a colonização ou por que eram da nobreza. Mas os anos passam e a monarquia faliu. Porque as mesmas pessoas são donas dos mesmos pedaços de terra? Terra esta, não se engane, não totalmente aproveitada. Mas abrir mão de um pedaço para dar a quem não tem? Pecado! Absurdo! Inimaginável! Nem mencione isto, seu vermelho maldito! Não sou vermelho, branco, preto, azul, verde, ou cor alguma. Sou justo. Não fui eu nem vermelho algum quem escreveu os direitos do homem, não fui eu que coloquei lá o direito a propriedade privada, não foi, tampouco, um vermelho que fez a Revolução Francesa.


Também não fui eu quem tirou as terras de seu ancestral a milhares de anos, mas fui eu quem vocês culparam. E fui eu quem perdeu a casa. Eu e mais centenas de milhares. Sou eu e mais centenas de milhares que esperam um pedaço de terra, não utilizada mesmo, que possa chamar de minha, de lar. Sou eu e centenas de milhares que somos postos de lado e vemos vocês desfilarem com o orgulho e mesquinhez que só vocês têm. Somos nós que esperamos sentados, que morremos esperando, mas que ainda assim temos esperanças de ver nossas casas, nossos lares. Porque vocês podem ter um lar e nós não? Porque vocês podem ter um santuário e nós não? Vocês têm seus direitos, porque nós não temos? Não somos homens também? Não somos humanos? Somos inferiores a vocês, por acaso?Queremos construir também nossa história, queremos que nossos filhos a continuem. Queremos chegar em casa, depois de um dia de trabalho, e descansar. Queremos nós, homens sem origem, poder dizer Lar Doce Lar.