terça-feira, 25 de setembro de 2012

Criaturas de expressões grotescas, de pernas viradas ao avesso e ossos saltando às juntas aglutinam-se ao redor da fogueira onde as mulheres são queimadas - as mulheres são queimadas - as mulheres são queimadas - as mulheres são mulheres - as queimadas as mulheres são mulheres são queimadas - dantesco! algum berro horrorizado ao longe, apenas para ser ignorado - a dor da indiferença - chora! nem medo tens o direito de sentir! as mulheres na fogueira lamentam serem mulheres na fogueira. as mulheres na fogueira se debatem, tentando livrar-se das garras muito bem apertadas do fogo, das garras muito bem ajuntadas de sua própria carne carbonizada. as mulheres foram queimadas e as bestas estão a sorrir, suas patas quebradas e deslocadas garantem a inconstância do movimento, o tombo e a dor e elas riem. as bestas caem e riem, algumas caem na fogueira, com as mulheres que lamentavam ser mulheres, e riem enquanto queimam e se misturam às cinzas das mulheres. chora! diante desta cena, nem as bestas nem as mulheres queimadas nem mesmo deus, que observa tudo em seus últimos e desesperados arranques de fôlego moribundos, prestaram atenção em você. a dor da indiferença. pula na fogueira! nem o fogo te queima! sofra! viva morto como um fantasma!

sábado, 22 de setembro de 2012

Foi só quando ela o abraçou por trás - quando ela o empurrara para fora de sua própria mente - que ele entendeu que não poderia mais ficar ali. Desculpe, disse ele, não é nada pessoal... parou um momento e completou é sim... é muito pessoal, pessoal demais. E era, não conseguiria, pessoalmente falando, mais suportar estar ali, viver ali, se sentia como um intruso, como um parasita de estimação, queria andar sob suas próprias pernas, sentir suas próprias dores, comemorar suas próprias conquistas. Talvez seja egoísmo meu, disse ele, mas não consigo mais te olhar de baixo, não saber se eu consigo andar sem sua ajuda. Era egoísmo. Ela chorou, a dor da perda e da culpa arrebatando-a para o quarto, a porta trancada e o grito abafado de então vai, vai agora porra, o desespero de não o ter mais por perto evidente em sua voz. Ele observou a cena em silêncio, ouvia ela chorar por trás da porta enquanto apanhava a mala e ia embora.

sábado, 15 de setembro de 2012

Do Abismo

Auto piedade! É esse o nome do pesado fardo que carrego! Reconhecer a própria insignificância perante o Universo é engrandecedor; o caos e a grandeza do infinito me trazem confiança quanto a minha existência pueril (poeiril?). Mas reconhecer a própria insignificância perante os outros é... triste... desconcertante... Ser realista, no meu caso, é ser inseguro e ciente das não tão longe limitações. Ah, que paredes grossas tem esse minúsculo cômodo... e quão opressoras são... quão claustrofóbico é permanecer aqui, mas mesmo assim fico... não há como fugir. Sei que sou fraco, sei disso... haha, dou risadas na cara da fraqueza, não é ela que me perturba. Sei que perderei, deixarei cair aquilo que seguro querido em meus braços frágeis e sei que não tardará, mas isso também não é o problema. Não tanto perder, mas esperar perder a qualquer tempo. A iminência da queda que me consome, este é o problema. O problema é esperar tropeçar a cada passo, sentir o abismo a cada relance... O pior desespero é o de acordar de madrugada pela perna contraída e suplicar aos berros que não, por favor, não! e se agarrar ao travesseiro no aguardo da excruciante dor de dilaceração muscular e, por fim, se entregar aos braços da cãibra. A espera da dor... dói. Sei que sou fraco pois esta dói mais. Sei que sou fraco pois berro. Sei que sou fraco pois sei que chorarei quando a dor enfim chegar. Penso, às vezes, que talvez seja melhor eu mesmo infligi-la, não sei, pode ser que doa menos uma dor causada por mim. Mas sou fraco. Não tenho coragem... A pequenez perante os outros me frustra, tamanho é meu ego ferido. O Universo não, ele tem pedestal de grandeza aos meus olhos, mas as pessoas... detesto admitir todos os dias o quão maiores são, o quão miserável - em tantas conotações da palavra - eu sou. Estou com frio agora... literalmente, não é figura de linguagem. Com frio e com calor e enjoado e triste. E cansado... a dor no meu corpo que me cansa é a mesma que me impede de dormir e descansar. Me sinto lixo contraído... Enfim... não sei se alguém sabe como é isso... dificilmente... mas talvez eu tenha algum companheiro de abismo. É claro que ele estará muito ocupado com suas próprias divagações sobre a dor da queda, cada um sabe de seus ossos quebrados.
Moça da marca do coração partido:
Que incoerente és...
Pois só fazes curar meu peito ferido.

Te amo
Ponto
Não há nada mais há declarar

Te amo
Pronto
Que sua marca maranhense venha me abraçar.

Velório

Eu gostaria de agradecer à minha mãe, meu pai... por estarem comigo a vida toda, me apoiarem, me incentivarem... também aos meus amigos, desde a escola, sim estou falando de vocês, Pedro, Juliana, Joãozinho, Jairo... e toda a galera que eu não mencionei. Ãhm... quem mais? Meu avô, logo estarei com ele, minha avó Tita, claro... É... acho que é tudo. Gostaria de deixar meu desprezo também... pra começar, à Marjorie, minha namorada, Thiago Mendonça de Carvalho, o amante dela, seja lá quem for, Gustavo, que roubou minha promoção... acho que só... Tive uma vida razoável, até... deu pra ser considerada boa, eu acho... bom... que mais? Um lamento por nunca ter conseguido conhecer Fernandinha depois de crescida, aquela que, para os que não sabem, foi minha paixão de infância... E... é isso, eu acho... já posso morrer. Beijos para todos, os salgados estão lá no fundo, junto das bebidas, estas estão em isopores, já tá tudo arranjado. Até nunca mais.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012


IX - O abismo

Pascal tinha um abismo, com ele em movimento.
- Pena! tudo é abismo - ação, desejo, sonho,
Palavra! E no meu pelo que de pé eu ponho
Muitas vezes do Medo ouço passar o vento.

Ao alto, abaixo, além, a profundeza, o mar,
O silêncio, o espaço, horrível, cativante...
Em minhas noites Deus, com mão conciliante,
Desenha um pesadelo vário e singular.

Temo o sono assim como se teme a voragem,
Cheia de vago horror, e com perdida margem;
Pelas janelas só o infinito vou ver,

Meu espírito sempre habitado de espasmo,
Do nada inveja mesmo é o insensível marasmo;
- Ah! Não sair jamais do Número e do Ser!

Baudelaire, em As Flores do Mal (tradução de Mário Laranjeira)

sábado, 1 de setembro de 2012


Julho
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Não, leitor, não é pra vc entender
Eis que eu estava certo. Meu futuro é previsível, eu lhe falei... Tá ouvindo os tambores rufando? São a preparação para meu desfecho infeliz, cortinas se levantam para então nos cobrir, que seja assim, que seja. Ah, a impotência perante o destino, a missão divina é de frustração. Como que tal complexo e longo processo pode acabar em apenas três simples letras, isso eu não sei. Mas é o fim, sem dúvida. O fim e o tal nada que houver depois dele.