domingo, 27 de janeiro de 2013

Mórbida flor,
eis que desabrocha sem vontade.
A primavera não foi tão gentil com tuas pétalas...
Deverias ter padecido no inverno,
enquanto ainda botão...

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Tentativa de Suicídio

Assobiava Raul Seixas enquanto saía da barca, já bem atrasado para a faculdade. Na multidão de gente, uma se destacava... era uma mulher, por volta dos seus quarenta e tantos anos, branca, cabelos castanhos curtos, meio gorda... Usava um vestido florido que terminava no joelho, permitindo ver suas pernas não depiladas. A mulher se encontrava na grade que separava a plataforma de embarque do mar sujo da Baía de Guanabara, com uma perna para dentro da plataforma e outra para fora. "Ela vai pular", pensei. E pulou... a mulher terminou de escalar a grade com muita calma, com movimentos cuidadosos, se posicionou na beira da plataforma e se jogou no mar, sem retornar.
- Ela caiu! - alguém berrou.
- Ela se jogou... - eu sussurrei.
- Ela se jogou! - berraram.
- Ah bem que ela tinha deixado o rádio! - uma mulher disse.
- Alguém ajuda ela! Alguém chama ajuda!
- Deixa ela lá! Ela que se jogou!
- Maluca! - disse alguém entre risos.
A silhueta da mulher apareceu novamente, mas seu rosto não saiu da água. Um homem se jogou para ajudá-la, um segurança pedia ajuda pelo rádio. Logo uma multidão se formava para ver o resgate. Alguém me empurrou, eu andei e vi ela sendo tirada de lá. Fui embora... não acho que tenha dado tempo dela se afogar, mas não fiquei para saber... Estava confuso e me irritava as pessoas vendo a situação com graça... Suponho que todos tenham o direito de se expressar como quiserem, mas me irritava.

O que se passava pela minha cabeça, a partir do momento em que vi aquela mulher era: "Eu devo ajudá-la..." Mas eu nem estava disposto a ajudá-la e nem sequer queria ajudá-la... Para ser sincero, não sabia nem se deveria ajudá-la... O episódio foi um grande confronto para mim... Aquela mulher, quer sofresse de depressão ou alguma doença psicológica/psiquiátrica, quer não, aquela mulher esfregou na minha cara que talvez a vida não valha a pena... Fiquei pensando no que levaria uma pessoa a despir-se de sua vida, a coisa que deveria ser mais cara para ela, a única coisa que ela de fato tem e é dela... Não consigo sequer imaginar a resposta... ainda assim, ela o fez, ela se jogou. Um confronto... ela parecia tão calma, tão pensado aquele ato... Mais tarde uma garota falou "ela se jogou para chamar atenção". Tenho certeza que não foi isso, não pode ter sido... ela não subiu... talvez tenha sido um ataque ou algo assim... eu não sei como funcionam psicopatologias ou mesmo neuropatologias... tanto faz... a questão que ficou é: Será que a vida realmente vale a pena?

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Errar é Humano 1 e 2

Errar é humano
e pelas estradas do mundo, sou humano
e pelas vidas que vivi
pelas mortes que sofri
e pelas sortes que encontrei
e pelos destinos que jamais alcancei,
sou humano.

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Errar é humano;
Perdoar é prepotente.
‎" Entrou um homem de idade indeterminada, fisionomia indeterminada, naquela fase da vida em que é difícil adivinhar a idade; não era bonito nem feio, não era alto nem baixo, não era louro nem moreno. A natureza não lhe dera nenhum traço marcante, notável, nem ruim, nem bom. Muitos o chamavam de Ivan Ivánitch, outros, de Ivan Vassílievitch, e outros, ainda, de Ivan Mikháilitch.
Quanto ao sobrenome da família, também havia diferenças: uns diziam que era Ivánov, outros o chamavam de Vassíliev ou Andréiev, e outros ainda achavam que era Alekséiev.
Um desconhecido que o visse pela primeira vez e escutasse seu nome o esqueceria logo em seguida, e esqueceria também seu rosto; o que ele falava nem se percebia. Sua presença nada acrescentava à sociedade, assim como sua ausência nada retirava dela. Sua mente não possuía senso de humor, originalidade, nem outros traços peculiares, a exemplo do corpo.
Talvez ele soubesse pelo menos contar tudo o que via e escutava e com isso despertar o interesse dos outros; no entanto, não ia a parte alguma: como nascera em Petersburgo, não viajava a lugar nenhum; em consequência, via e escutava aquilo que os outros também sabiam.
Seria simpático aquele homem? Será que amava, odiava, sofria? Na certa devia amar e não amar, sofrer, porque afinal ninguém está a salvo disso. Mas, sabe-se lá como, ele achou um jeito de amar todo mundo. Existem pessoas assim, em quem os outros, por mais que se esforcem, não conseguem despertar nenhum espírito de animosidade, de vingança etc. Não importa o que façam com tais pessoas, elas sempre se mostram amáveis. De resto, é preciso lhes fazer justiça e reconhecer que seu amor, se o dividirmos em graus, jamais alcança o nível do ardor. Embora digam que tais pessoas amam a todos e por isso são boas, no fundo não amam ninguém e são boas apenas porque não são más.
Se diante de um homem assim alguém dá esmola a um mendigo, ele lhe joga também sua moedinha, e se alguém xinga, expulsa ou faz algo atrevido com outras pessoas, ele age da mesma forma. Não se pode dizer que é rico, porque é antes pobre do que rico; mas positivamente tampouco se pode dizer que é pobre, porque na verdade há muita gente mais pobre do que ele.
Tem uma espécie de renda de trezentos rublos por ano e, além disso, tem um cargo irrelevante no serviço público e ganha um salário irrelevante: não passa necessidades, não toma empréstimos de ninguém e, menos ainda, não passa pela cabeça de ninguém lhe pedir dinheiro emprestado.
No seu emprego, não tem nenhuma ocupação especial e constante, porque os colegas e os chefes não conseguem de maneira nenhuma saber o que ele faz pior e o que faz melhor, de tal modo que é impossível determinar para o que ele é especialmente capaz. Se lhe dão isso ou aquilo para fazer, ele o faz de tal modo que o chefe sempre se vê em apuros, sem saber como avaliar seu trabalho; examina, examina, lê, relê, e só consegue dizer: 'Deixe para lá, depois examino melhor... Sim, está quase como deve ser'.
Nunca passa pelo seu rosto o menor traço de preocupação, de fantasia, que demonstre que, naquele minuto, ele está conversando consigo mesmo, e ele nunca é visto dirigindo um olhar cobiçoso a algum objeto exterior, indicativo de que deseja mantê-lo sob sua alçada.
Um conhecido o encontra na rua: 'Aonde vai?', pergunta. 'Pois é, estou indo para o trabalho, ou para as lojas, ou visitar alguém.' E o outro diz: 'É melhor vir comigo ao correio, ou então vamos juntos ao alfaiate, ou vamos dar um passeio'. E ele o acompanha, vai ao alfaiate, ao correio e passeia na direção oposta à que antes estava indo.
É difícil que alguém, exceto sua mãe, tenha percebido seu aparecimento no mundo, muitos poucos reparam nele no decorrer da vida, mas seguramente ninguém vai notar como ele desaparecerá do mundo; ninguém vai perguntar por ele, nem vai lamentá-lo, e ninguém vai se alegrar com sua morte. Ele não tem inimigos nem amigos, mas seus conhecidos são numerosos. Talvez só o cortejo fúnebre atraia atenção de um passante, que renderá homenagem àquele rosto indeterminado, pela primeira vez objeto de honra de uma reverência em que se abaixa bastante a cabeça; talvez até algum outro curioso venha correndo para a frente do cortejo a fim de saber qual é o nome do falecido, para logo depois esquecê-lo.
Pois esse Alekséiev, Vassíliev, Andréiev ou como preferirem é uma espécie de alusão incompleta e impessoal à matéria humana, uma reverberação surda de seu vago reflexo."

Retirado de Oblómov, de Ivan Gontcharóv

domingo, 6 de janeiro de 2013

Não, não desejava morrer, desejava apenas observar a morte de perto. Era assim que se curava da impotência, afinal e, raciocinara, se já era prazeroso assistir à morte alheia, que dirá a própria! Imagine só! a minha carne sangrando feito bala, os ossos se partindo com barulho e as veias se rompendo, o sangue espirrando para fora. Ah sim, a dor!! Que maravilha! Podia sentir-se morto, ah que delícia, qual não seria o tamanho do orgasmo quando seu cérebro estourasse, seus olhos caíssem para fora de seu crânio, o doce amassado da vida diante de mim, eu! A vida não presta afinal de contas! Homens? Mulheres? Nada disso presta. Não sou nenhum, não senhor, sou algo além! Muito além! Se agora rio é porque sei verdadeiramente o que é felicidade! Não! Nenhum de vocês jamais encontrarão, mas eu sei! Eu sinto! Eu tenho!


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Eu te perdoo. Te perdoo porque sei que o que fez é culpa minha. Não te dei atenção suficiente, não te amei o suficiente, não te fiz o suficiente, não te dei o suficiente, não sangrei o suficiente, não suicidei o suficiente, não sofri o suficiente, não doí o suficiente, não morri. Mas não se preocupe, amor, tudo isso vai mudar.


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Ah, a mediocridade! A mediocridade é um mito! Depois continuo...

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

o toque além do tato que eu tanto necessito... o sentir além dos sentido, o estar e ser eu no mundo. o corpo que me media não é mais necessário, sou eu puro e nada mais. quero SÓ ser, SÓ estar. quero me livrar desse caixão de carne, ossos, sangue, pelos, excrementos, de sensações traduzidas, digitais, de cores filtradas, de formas borradas... ah, o querer... o poder é bem diferente... o que eu quero, sei bem que não existe... mas mesmo assim, tem um ardor em meu peito que não me deixa desejar outra coisa...
comecei o ano passado com perspectiva. ao longo do ano, esta mudou diversas vezes e pelos mais diferentes motivos: pessoas que eu conheci, as eleições, minha efêmera e quase nula participação no processo de reivindicação de direitos dos índios da aldeia maracanã, etc, etc... e, começo este, no entanto, sem nenhuma. para ser mais direto, não sinto sequer um "começo" propriamente dito. talvez seja o efeito das aulas de verão causadas pela greve, talvez seja outra coisa qualquer, enfim, eu não sei mesmo, só sei que esse ano o ritual não me atinge. vi os fogos grandiosos da praia de copacabana sem realmente entender porque aquele fuzuê todo. virou o mês e cá estamos... cá estou, melhor dizendo, sem perspectiva. minha única certeza é a maldita prova de sociologia quarta que vem. não digo que ano passado não tenha sido bom para mim, não me entendam mal, foi um dos anos mais incríveis da minha vida, a soma pode ter certeza que foi positiva. mas, acabou-se com um eu inseguro de seu curso, de suas escolhas, de seus posicionamentos, de sua eficiência e, mais importante, de sua competência. creio que não interesse bem a vocês tudo isso e não os culpo: é um porre, mesmo! na verdade, acho que não interessa nem bem a mim! mas escrevo mesmo assim, porque é isso que eu vinha fazendo e era isso que me deixava feliz, essa coisa que eu parei... escrever pra ninguém, só por escrever... e, sendo bem franco, estou feliz de fazer isso neste momento. feliz 2013